segunda-feira, 27 de fevereiro de 2017

Mulheres ainda buscam por mais espaço

*Publicado na página de Responsabilidade Social, no jornal O LIBERAL de 10/03/2016

BRENDA PANTOJA
Da Redação

                          Mais de 70 anos. Este é o prazo previsto para que seja superada a disparidade salarial entre homens e mulheres se o mercado de trabalho continuar no ritmo em que está, de acordo com a Organização Internacional do Trabalho (OIT). A entidade divulgou nesta semana o relatório “Mulheres no Trabalho: Tendências 2016”, com dados de 178 países, mostrando que, em nível global, a diferença diminuiu apenas 0,6% entre 1995 e 2015. Os índices apresentados no documento comprovam a dura realidade das mulheres no cenário profissional, reforçando a importância de lutar pela equidade de gênero nas empresas e nas universidades. 
Os dados analisados pela OIT apontaram que as mulheres representam menos de 40% do total de empregados, têm uma carga horária de trabalho maior do que os homens e ainda assim ganham menos em relação à mesma posição. Em média, as mulheres recebem um salário 23% menor do que é pago aos homens para desempenhar a mesma função. Para a OIT, fica claro que esta lacuna não pode ser explicada unicamente por diferenças na educação ou pela idade, mas sim está relacionada à desvalorização do trabalho realizado por elas, bem como à necessidade das mulheres fazerem pausas na carreira para poderem assegurar as responsabilidades adicionais por exemplo após o nascimento de uma criança.
Quando se considera o trabalho pago e as tarefas domésticas não remuneradas, as mulheres continuam a trabalhar mais horas por dia do que os homens. Nos países em desenvolvimento, a jornada deles gira em torno de oito horas e sete minutos, enquanto a delas chega a nove horas e vinte minutos. O relatório afirma, ainda, que as mulheres têm mais chances de ficar desempregadas do que os homens, com taxas de desemprego global de 6,2% contra  5,5%. A desigualdade impacta a aposentadoria da população feminina, pois segundo a OIT, as mulheres representam quase 65% das pessoas que estão na idade de receber os benefícios de aposentadoria e pensões, mas não recebem absolutamente nada.
O diretor do escritório da OIT em Nova York, Vinícius Pinheiro, falou em entrevista à Rádio ONU sobre as recomendações para melhorar esse quadro. “Primeiro, é fundamental acabar com essa diferença salarial no mercado de trabalho. Não existe qualquer motivo para que uma mulher que tenha o mesmo desempenho, que esteja na mesma posição de um homem na força de trabalho, tenha um salário diferente. Em segundo lugar, é fundamental reconhecer, reduzir e redistribuir o trabalho doméstico, que não é assalariado e que é feito em casa. As mulheres também têm uma carga maior em relação ao trabalho doméstico. O acesso ao sistema de proteção social também é fundamental, incluindo benefícios para a maternidade e creches”, pontua.

DIREITOS
Equidade de gênero no mercado, de acordo com o conceito divulgado e trabalhado pela ONU Mulheres, significa que homens e mulheres sejam tratados de forma justa, de acordo com as suas respectivas necessidades. O tratamento deve considerar, valorizar e favorecer de maneira equivalente direitos, benefícios, obrigações e oportunidades entre homens e mulheres. Promover a igualdade nos negócios, além de garantir um direito humano fundamental, é uma atitude saudável para as empresas, pois é essencial para construir economias fortes, estabelecer sociedades mais estáveis e justas, melhorando a qualidade de vida de todos. 
Dados recentes do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) e da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (Pnad) demonstram que as profissionais do sexo feminino são um público muito relevante a ser considerado em um país com cerca de 100 milhões de mulheres. A empregabilidade com carteira assinada cresceu na última década e, em 2011, a renda das brasileiras chegou a R$ 647 bilhões, além de chefiarem quatro em cada dez famílias. 
Apesar de levantamentos comprovando que a escolaridade das mulheres brasileiras tem aumentado em relação aos homens, elas ainda são minoria em cargos de chefia ou naqueles que exigem maior qualificação. 
A equidade de gênero foi uma luta pessoal enfrentada por Lecy Garcia, 59, que hoje é sócia e diretora executiva em uma empresa da construção civil. Ela também integra a diretoria do Sindicato da Indústria da Construção do Pará (Sinduscon-PA) e atua há mais de 20 anos na área. Exercendo posição de liderança em um setor predominantemente masculino, ela se preocupa em sensibilizar o corpo de funcionários sobre o tema. “Uma das maiores dificuldades da mulher é lidar com os vários papéis que exerce no dia a dia e existe algo cultural de ver a mulher como alguém frágil. Penso que se trata mais de uma sensibilidade e isso é uma força que nós temos”, observa.
Em sua equipe administrativa e operacional, ela está cercada por outras mulheres, que ocupam cargos na gerência de projetos, engenheiras, arquitetas, técnicas em segurança do trabalho, entre outras. A equidade de gênero é um dos princípios da empresa. "É errado ter essa diferença de salário, que infelizmente ainda ocorre, porque o gênero não determina a competência. No entanto, na minha trajetória profissional eu percebi que a mulher sempre precisa provar a sua capacidade. Os homens não são questionados da mesma forma”, acrescenta. Como mulher e mãe, Lecy tem mais sensibilidade para lidar com conflitos e problemas pessoais das funcionárias.
“Se uma trabalhadora pede para acompanhar o filho doente ao hospital, eu libero. Libero porque se ela não for, não vai ficar inteira na empresa. Eu vivi isto. Ao mesmo tempo em que é preciso essa flexibilidade com a mulher que é trabalhadora e mãe, é necessário que as próprias mulheres não se percam em uma autocobrança, uma carga excessiva, querendo ser super mulheres”, aconselha. Através de palestras e cursos de iniciação política, o respeito à diversidade é bastante discutido com os funcionários.
Para ela, contribuir para o desenvolvimento da consciência crítica das pessoas é o caminho para alcançar equipes de excelência. É essencial, segundo Lecy, que as mulheres se posicionem com argumentos fortes e seguros sobre a equidade de gênero nos empregos, deixando um pouco de lado a competição entre elas mesmas. “Sempre que instalamos um canteiro de obras, procuramos gerar renda na comunidade do entorno e as mulheres sempre estão presentes, muitas vezes fornecendo alimentação e vendendo quentinhas. Impactar positivamente o público externo também é uma forma de empoderar economicamente essas mulheres”, complementa.

Igualdade de gênero ainda está longe de ser realidade na região Norte

A realidade da equidade de gênero ainda está longe de ser alcançada, acredita a socióloga Ádima Monteiro. Ela destaca alguns dos sinais desta deficiência na sociedade, tais como a ocupação de apenas 10% das vagas de parlamentares na Câmara dos Deputados por mulheres, mesmo que elas correspondam a 52% do eleitorado brasileiro. A desigualdade ficou evidenciada no resultado das eleições de 2014, em que apenas uma mulher foi eleita dentre os 27 governadores e a bancada feminina na Assembleia Legislativa do Pará reduziu de seis para três deputadas estaduais.
“Mais um exemplo é que a região Norte tem o menor número de trabalhadoras domésticas com carteira assinada. A cada 100 mulheres, a média do Brasil é de 26,2 trabalhadoras com carteira assinada. Em 2012, a região Norte contabilizava o vergonhoso dado de apenas 12%, segundo o IPEA [Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada]”, ressalta. Outro elemento é a ausência e precariedade de creches públicas no país, o que afasta muitas mulheres das vagas de emprego. “Em Belém, por exemplo, temos aproximadamente 120 mil crianças de 0 a 5 anos fora da escola e apenas 7 mil estão sendo atendidas, mas de forma totalmente precarizada”, afirma.
Ádima, que é militante do Movimento de Mulheres Marias, alerta para a importância da população feminina se organizar para encontrar soluções conjuntas e superar as desigualdades, ampliando a participação das mulheres na política. Embora a conscientização dos homens seja necessária para derrubar a ideia de desigualdade no mercado de trabalho, ela defende que o debate passa pelo empoderamento das próprias mulheres. “Como dizia Paulo Freire, o único sujeito que pode se libertar da opressão é o oprimido. Ou seja, as mulheres tem muita força para romper com esta naturalização de que somos inferiores aos homens. Foi discutindo e organizando as mulheres que os movimentos sociais feministas conseguiram conquistas históricas para nós”, completa.

DIPLOMA
O ambiente acadêmico também tem desigualdade. A Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura (Unesco) divulgou, recentemente, que as mulheres são apenas 28% das pesquisadoras em todo o mundo. O índice fica ainda menor conforme é avaliada a participação delas em posições hierárquicas mais elevadas e atreladas à tomada de decisões. A pesquisa constata que as mulheres também tem menos acesso a financiamento, redes e cargos de destaque, conjuntura que as coloca em desvantagem para a publicação científica de alto impacto.
Ainda de acordo com a Unesco, as probabilidades de uma mulher obter um diploma de bacharel, mestre e doutor em campos relacionados à ciência seriam de, respectivamente, 18%, 8% e 2%. Para os estudantes homens, os valores aumentariam, chegando a 37%, 18% e 6%. 
A professora adjunta do Instituto de Ciências Biológicas da Universidade Federal do Pará, Joyce Kelly do Rosário da Silva, 33, é um exemplo que vai de encontro a estes desanimadores índices. Ela foi contemplada com o prêmio “Para Mulheres na Ciência”, em 2013, e atua como pesquisadora há 16 anos.
Graduada em Química, com mestrado e doutorado em Química Orgânica, Joyce atualmente cursa o pós-doutorado na área, na University of Alabama in Huntsville (UAH), nos Estados Unidos. Para ela, a conquista de mais espaço na academia é um avanço pontual. “Na UFPA, o Instituto de Ciências Biológicas apresenta cerca de 53% do corpo docente formado por mulheres. Por outro lado, este número é de apenas 24% no Instituto de Ciências Exatas e Naturais, onde cursei minha graduação e pós-graduação. Eu percebo que ainda há uma participação pequena das mulheres nas ciências exatas. Durante minha, éramos a minoria, e apesar do número ter aumentado ainda vai levar um tempo para que estas garotas ocupem cargos importantes”, avalia. 
Outro dado que reflete a desigualdade citado por Joyce é o de que apenas 25% das bolsas de produtividade do Conselho nacional do Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovação (CNPq) são destinadas para mulheres. “Décadas passadas o mercado de trabalho era restrito aos homens e isso afetou diretamente o campo científico. A mulher cientista encontra dificuldades para administrar a vida pessoal, com mudanças como a maternidade e a carreira e consequentemente este fator influencia na sua produção. Hoje em dia acredito que há um maior incentivo do ponto de vista social e familiar, mas teremos resultados a longo prazo”, resume.
Ser mulher e fazer ciência na região Norte do país tem algumas particularidades, para a pesquisadora, que foi a única laureada da região em todas as edições. “Atuar na Amazônia torna-se mais difícil devido à falta de investimentos das intuições de fomento, tanto federais, quanto estaduais e menor concentração de doutores na região. Para solidificar uma carreira como cientista é preciso saber lidar com muitos desafios, uma vez que a desigualdade é real”, comenta. A expectativa dela é que o aumento da inserção das mulheres na academia promova mudanças em diversos aspectos, como maior reconhecimento profissional e maior representatividade nos cargos de chefia nos institutos de pesquisas.

terça-feira, 21 de fevereiro de 2017

Combate ao desperdício muda postura

*Publicado na página de Responsabilidade Social, no jornal O LIBERAL de 03/03/2016

BRENDA PANTOJA
Da Redação

Diferente das garrafas PET e latinhas de alumínio, que possuem um valor no mercado de reciclagem, alguns resíduos vão direto para o lixo sem que o consumidor pense duas vezes em um destino mais responsável. É o caso de objetos como embalagens de shampoo e condicionador, esponjas de lavar louça, materiais de escrita e itens de higiene bucal. São produtos comuns e amplamente usados no dia a dia de milhões de lares, mas a falta de consciência no consumo faz com que toneladas deles se acumulem nos lixões e aterros, poluindo o meio ambiente. Quebrar esse ciclo é o objetivo de campanhas como a “Faxina nos Armários”, promovida até 10 de maio pela Faber-Castell em parceria com a TerraCycle.
No bairro do Coqueiro, em Ananindeua, os alunos do Colégio Interativo são participantes ativos do projeto e já se apropriaram dessa responsabilidade ambiental. Eles promovem a coleta desses resíduos, considerados de difícil reciclabilidade, engajando toda a comunidade escolar e a vizinhança na tarefa. Em menos de um mês de ação, eles conseguiram mais de 500 peças para o “Faxina nos Armários”, o que inclui lápis, lapiseiras, canetas, canetinhas, giz de cera e marcadores de texto quebrados ou em desuso. Assim que conseguirem encher uma caixa grande, todo o material será enviado a São Paulo, sem custo algum para a escola, para ser transformado em matéria-prima e introduzido na estrutura de novos produtos como lixeiras, pás de lixo e suportes de notebook.
Este é o modelo de arrecadação difundido pela TerraCycle, empresa multinacional especialista em reciclagem, que atua com várias frentes de coleta. Através dela, o colégio participa de outras campanhas nacionais, como a brigada da Colgate, que recebe itens de higiene bucal de qualquer marca, e a da Scotch Bridge, que coleta todo tipo de esponja de limpeza. Os estudantes também começaram a reunir as embalagens de produtos para cabelo para a campanha da Garnier Fructis, apesar de ainda aguardarem a confirmação da inscrição. Para eles, o importante é evitar que haja o desperdício.

A diretora Maria Emília Maia conta que a mobilização começou no ano passado, como um incentivo para a educação ambiental e valia ponto para as avaliações. Agora, se tornou uma preocupação genuína  do corpo estudantil, que sai às ruas para conscientizar os moradores mesmo sem ser mais uma atividade obrigatória. Os projetos preveem uma recompensa para os times que arrecadarem mais e garantem a eles um retorno financeiro, que pode ser revertido para uma instituição sem fins lucrativos.  "Vemos uma clara consequência desse trabalho na mudança de postura deles em relação ao lixo. Até a sala de aula passou a ser mais limpa depois que nos envolvemos com essa coleta. Eles estão mais conscientes”, observa o professor de Biologia Fábio Albuquerque, que também aproveita a iniciativa para discutir conteúdos como equilíbrio ambiental em sala de aula.

Em poucos dias, a estudante Anabela Souza, 14, do 1º ano, conseguiu juntar sozinha 290 itens de escrita, ficando como primeira colocada entre o corpo de 115 alunos. Para incentivá-los, a direção oferece alguns prêmios como lanche especial, brindes ecológicos ou até ingressos para o cinema. Sem timidez, a menina e outros colegas visitam as casas nas proximidades para pedir a colaboração de todos. “A gente explica que é um projeto que vai ajudar o meio ambiente. Diminuindo o acúmulo de lixo na rua, podemos diminuir os alagamentos, a contaminação e até a proliferação do mosquito da dengue”, destaca.
Marcelo César, 15, está no nono ano e percebeu que a reciclagem é pouco praticada por causa da desinformação. “As pessoas acham que fazer a coleta seletiva é complicado, depende só do poder público ou é apenas de garrafas pet e papel. Esse material que estamos recolhendo, muitos não sabiam que é possível reaproveitar. Alguns vizinhos compram a ideia e agora estão começando a separar e guardar para nós”, relata. Para o adolescente Pedro de Mendonça, 13, é gratificante sentir que está fazendo a diferença. “É muito legal ver o efeito da união dos alunos, ver que somos capazes de reunir bastante material e conscientizar a nossa família e amigos. Todo mundo acaba se envolvendo”, comenta. 
O caráter social sempre foi fortalecido na escola, ressalta a diretora, o que foi decisivo para o engajamento na questão ambiental. “Em outros anos, arrecadamos roupas e alimentos para as famílias carentes do Lixão do Aurá. Nesse mesmo estilo, os meninos e meninas participaram de tudo, inclusive da entrega. Acho que isso ajudou no desembaraço de pedir nas casas, na vontade de transformar uma situação”, avalia. Dependendo do volume arrecadado durante as campanhas da TerraCycle, a diretora espera poder reverter algum valor para as famílias do Aurá ou fazer alguma melhoria na unidade de ensino.
“Se os estudantes verem que o esforço deles pode render uma mudança concreta, vão ficar muito empolgados. O nosso objetivo é que eles adotem essa consciência para a vida e se tornem multiplicadores”, acrescenta. O Colégio Interativo também é adepto da coleta seletiva e, pelo menos três vezes por semana, eles recebem a visita de cooperativas de catadores. Os pontos acumulados junto à TerraCycle no ano passado ainda não foram resgatados. Os pais também são grandes apoiadores da iniciativa, a exemplo da mãe do aluno Eliseu de Souza, 11. “Ela trabalha como merendeira em uma escola de Marituba e notou que todo esse material era desperdiçado lá. Aí ela foi juntando tudo e conseguimos contribuir com uma caixa grandona cheia de lápis e canetas”, lembra ele, que está animado de poder participar do projeto.

Campanha pretende arrecadar de 150 a 200 mil itens de escrita


A expectativa da Faber-Castell, que está na quarta edição da campanha, é arrecadar de 150 a 200 mil itens de escrita até o final do prazo. Somando os três anos de realização, foram recolhidas mais de 478 mil unidades por dois mil times de coleta de todo o Brasil. A arrecadação começou em fevereiro, período em que os alunos ficam animados com o clima de volta às aulas e com a compra de novos materiais escolares.
É justamente nesse contexto que surge a iniciativa, inserindo o consumo consciente na pauta das escolas. “O tema está diretamente ligado ao desmatamento da Amazônia, entre outras matas nativas. Por isso, é de extrema importância que os alunos da região desenvolvam uma responsabilidade socioambiental desde a infância”, enfatiza Elaine Mandado, gerente de comunicação da empresa.
Segundo ela, as escolas configuram mais de 50% dos participantes do programa, que também conta com a atuação de igrejas, ONGs e empresas. Elaine reforça que além de evitar que os instrumentos de escrita acabem no lixo, e, consequentemente nos aterros, o colaborador da Brigada de Instrumentos de Escrita acumula pontos, que podem ser revertidos em dinheiro para a doação a uma instituição sem fins lucrativos.

Consciência ecológica coletiva arrecada 27,5 toneladas de resíduos

Somente no ano passado, a TerraCycle arrecadou no Brasil o equivalente a 27 toneladas e meia de resíduos de vários tipos. A empresa foi criada em 2001, chegando em solo brasileiro em 2009, e atualmente está trabalhando com oito programas de reciclagem, que incluem ainda embalagens de protetor solar, de produtos de maquiagem e frascos de perfume. Mônica Pirrongelli, representante da empresa no país, enfatiza que o principal foco é promover a educação ambiental e a construção de uma consciência ecológica coletiva.
“A mobilização gera um engajamento em cadeia, uma mudança de atitude nas pessoas, e se baseia no protagonismo do consumidor. Ele não só passa a ser um personagem ativo na destinação desses resíduos, como também tem o lado social, pois o que ele arrecada pode ser revertido para uma escola ou instituição sem fins lucrativos”, frisa. Seguindo os parâmetros de cada projeto, os integrantes dos times precisam juntar uma quantia mínima para enviar a caixa de forma gratuita pelos Correios, após colar nela uma etiqueta especial disponível no site da TerraCycle.
O “Faxina nos Armários” computa pontos de remessas a partir de um quilo, sendo que o peso médio de um lápis ou uma caneta é de 12 gramas e cada unidade corresponde a uma doação de R$ 0,02. Mônica explica que os materiais coletados passam pelo processo de reciclagem, que inclui uma série de procedimentos, como a separação, a lavagem e a extrusão. Os resíduos são transformados em uma nova matéria-prima, chamada Pellet e ela é vendida e utilizada para a produção de outros objetos como bancos, lixeiras, etc. Mais informações sobre o funcionamento da TerraCycle, e especificamente da iniciativa da Faber-Castell, podem ser consultados no site www.terracycle.com.br.

quarta-feira, 15 de fevereiro de 2017

Cenário de obstáculos às doenças raras

*Publicado na página de Responsabilidade Social, no jornal O LIBERAL de 11/02/2016

ERRATA: A primeira foto (à esquerda) não corresponde a nenhum dos personagens citados na matéria


BRENDA PANTOJA
Da Redação

                                           Consultar vários médicos especialistas, peregrinando por hospitais dentro e fora do Estado, ter dificuldade em conseguir um diagnóstico preciso e saber exatamente que problema está sendo enfrentado, além de arcar com os custos de tratamentos e remédios caríssimos. Estes são os maiores obstáculos dos pacientes com doenças genéticas raras e suas famílias. O Ministério da Saúde estima que haja cerca de 13 milhões de brasileiros afetados por enfermidades raras, que atingem até 65 pessoas em cada grupo de 100 mil indivíduos. 
No Pará, a implantação da portaria 199/2014 é muito aguardada por essa parcela da população. Trata-se da Política Nacional de Atenção Integral às Pessoas com Doenças Raras, aprovada há dois anos, que garante atendimento no âmbito do Sistema Único de Saúde (SUS) e prevê incentivos. Enquanto a medida demora para sair do papel na maioria do país, as famílias buscam se unir em associações e grupos independentes para compartilhar informações sobre as doenças, os profissionais especializados, espaços de referência e até para articular meios de pagar viagens, quando necessário.
A mobilização ganha visibilidade neste mês, uma vez que o dia 29 de fevereiro foi escolhido para simbolizar o Dia Mundial das Doenças Raras. Como só acontece em anos bissextos, a data é celebrada no dia 28 nos demais anos. Para divulgar o tema, serão realizadas palestras, caminhadas e a inauguração do centro de apoio da Associação Paraense de Síndrome de Williams e Outras Doenças Raras (APSW & ODR). A entidade existe há dois anos e atende quase 60 famílias, recebendo também casos de mucopolissacaridose, distrofia muscular de Duchenne, picnodisostose, microcefalia e outras síndromes como a de Crouzon e de Guillain-Barré.
“O que tentamos fazer é abrir um caminho que não nos mostraram quando precisamos, tivemos que achar sozinhas e agora podemos ser uma ponte para outras pessoas que enfrentam essa luta”, define Amauriléia Gonçalves, 40, que atua como secretária na associação. Ela é mãe da Lisandra Gonçalves, 16, que é portadora da síndrome de Williams e esperou 13 anos para saber o diagnóstico. Amauriléia explica que desde bebê, a filha demonstrou problemas no desenvolvimento, custando a andar e falar e teve problemas cardíacos. “Consultamos muitos médicos, mas nenhum sabia o que era e nem como investigar. Até que cheguei ao hospital Bettina Ferro. Na época, o exame custava cinco mil reais. Conseguimos fazer através de um projeto da UFPA e a Lisandra foi a pioneira na realização desse teste no Pará”, conta.
Uma reclamação constante dos pacientes e familiares é a desinformação entre os médicos e demais profissionais da área da saúde. “A maioria nunca nem ouviu falar de algumas doenças raras, poucos locais fazem os exames necessários, muitas vezes tem que ir pra fora do estado. Sendo que o diagnóstico precoce é fundamental quando se trata desse assunto”, afirma. Os portadores da síndrome de Williams podem ter, ainda, complicações motoras e renais e déficit cognitivo, com deficiência mental leve a moderada, assim como também são muito amigáveis e alegres. Lisandra nunca precisou fazer cirurgias e atualmente tem o acompanhamento de 12 profissionais diferentes por meio do Serviço de Desenvolvimento e Crescimento – Caminhar, do Hospital Bettina Ferro, e do Hospital de Clínicas Gaspar Vianna.
A professora Naíde do Carmo, 47, precisou passar por cima de muita coisa para descobrir e saber como tratar que doença acometia as filhas Laís e Flávia, hoje com 22 e 20 anos de idade, respectivamente. Moradoras do município de Cametá, as filhas nasceram normais, mas apresentaram sintomas da mucopolissacaridose tipo 6 (MPS 6) por volta do primeiro aninho de vida. “Quando a Laís estava com um ano e meio, comecei a ir em vários médicos. As dificuldades de transporte e hospedagem eram grandes e só quatro anos depois foi que recebemos uma resposta”, lembra. 
Quando a doença das meninas foi identificada, elas foram selecionadas em um estudo para a criação de um remédio. A família passou cinco anos em Porto Alegre, participando da pesquisa, e elas responderam muito bem ao tratamento e ganharam o direito a receberem, por tempo indeterminado, o medicamento. Se eles tivessem que pagar pelo produto, o gasto seria de mais de R$ 16 mil por ano. “O remédio é distribuído pelo governo para nós e tem vezes que ameaça atrasar, mas aí eu ligo direto para o laboratório e eles resolvem”, diz.
Naíde e as filhas precisam viajar de Cametá para a capital uma vez por semana, para a reposição enzimática no Bettina Ferro. O trajeto é feito de ônibus, mas para evitar problema na coluna delas, chegam a passar semanas em Belém, na casa de familiares. “Quando tudo começou, não tínhamos informação, assistência, nada... Ainda falta muito apoio do governo, mas o conhecimento está melhorando e, principalmente, a articulação da sociedade, que precisa se fortalecer na briga pelos direitos e qualidade de vida desses pacientes”, comenta. A MPS tipo 6 se caracteriza pela baixa estatura, aumento do baço e limitação das articulações, mas não causa nenhum retardo mental, tanto que Laís e Flávia estão concluindo o ensino médio.

APSW & ODR
A trajetória da APSW & ODR começou com a funcionária pública Lígia Lopes, 33, presidente da entidade e mãe do Davi Neto, 9, também portador da síndrome de Williams. Segundo ela, na maternidade já foi possível perceber algumas características sindrômicas, mas o susto veio quando ele precisou operar de hérnia inguinal ainda aos três meses e depois foi internado por um problema no coração, passando alguns dias na UTI. Toda a investigação clínica só teve uma resposta quando o garoto tinha quase três anos. Lígia recorda, emocionada, que até os cinco anos, o filho teve três paradas cardiorrespiratórias, fez três cirurgias de hérnia e contraiu pneumonia oito vezes, entre outras complicações. 
“Infelizmente, tudo foi muito difícil. A saúde do Estado não tinha conhecimento e nem o suporte necessário para cuidar do meu filho. Tivemos que ir a São Paulo atrás de diagnóstico e de alguns tratamentos. O que a associação quer é fazer funcionar o que já existe, encaminhando as pessoas para profissionais de referência. Temos apenas quatro geneticistas no Estado”, pontua.
Ela realizou o primeiro encontro regional de síndrome de Williams, em 2014, o que ajudou bastante a identificar os 25 casos que a entidade acompanha no Estado. Ao encontrar uma pessoa com suspeita de doença rara, Lígia conta que eles procuram ir até o local para ajudar na busca pelo diagnóstico, em um trabalho de mapeamento.
Para ela, é mais interessante ter uma instituição que represente as doenças raras do que ter várias associações com pouca visibilidade, pois são poucos casos.
A dona de casa Francidalva Barros, 37, confirmou o diagnóstico da síndrome de Williams do filho Cauã, 6, somente no ano passado. A resposta veio por meio da assistência prestada pela Santa Casa e a UFPA. “Antes de conhecer a associação, eu tinha muita dificuldade para arranjar consulta com alguns especialistas. Ele faz acompanhamento com nefrologista, terapeuta ocupacional... para conseguir uma cardiologista pediátrica tive que esperar quase um ano. Os custos são altos, pois ele precisa de remédios para o coração e pressão arterial e não temos nenhum auxílio”, relata. Cauã aguarda há três anos para fazer uma cirurgia cardíaca no Hospital de Clínicas.

Elogios e críticas se cruzam nos tratamentos

Muitas mães que realizam  acompanhamento pelo Bettina Ferro ou pela Santa Casa, entre outros locais de referência, elogiaram as equipes multiprofissionais que acompanham os filhos, mas também criticaram a dificuldade de acesso. A burocracia e a lentidão do sistema público foi o que levou Gil Moreira, 42, e Márcia Lopes, 45, a correrem atrás de atendimento privado para a filha Rebeca Lopes, 16, que tem atrofia muscular espinhal tipo 3 (AME 3). Com o diagnóstico em mãos, por volta dos dois anos de idade, deram início ao tratamento em um projeto da Universidade Estadual do Pará (UEPA), e em uma clínica particular.
No entanto, Rebeca parou de andar aos quatro anos, em função de uma fisioterapia realizada erradamente pela clínica. “Eles não tinham conhecimento sobre a doença e apesar do laudo especificar as atividades, fizeram de forma errada e ela perdeu a marcha”, lembra Márcia. Por dificuldades financeiras e de locomoção, a família teve que interromper o tratamento quando ela completou seis anos. Somente em 2013, através de uma amiga da família, a analista de sistemas Nazaré Cardoso, 49, que conhece outros casos de AME 3, eles conseguiram arrecadar R$ 15 mil para ir a São Paulo realizar a cirurgia que corrigiu a escoliose dela, dando mais qualidade de vida. “As poucas clínicas de fisioterapia que sabem tratar o caso da Rebeca são muito caras e nós não temos carro para levar, nem conseguimos pagar todo dia o transporte especial”, lamenta.
A família chegou a realizar outras viagens para São Paulo e Fortaleza, para consultas de avaliação com médicos especialistas na doença, sempre com apoio de uma rede de amigos que contribui para os gastos. “O nosso plano agora é comprar um carro adaptado e uma nova cadeira, pois a dela está pequena. A cadeira com as adaptações necessárias custa mais de R$ 17 mil. Ela também precisa usar uma máquina para ajudar na respiração, que custa R$ 10 mil. Ao todo, nossos gastos chegariam a quase R$ 150 mil”, contabiliza o pai.
Ele reforça que as longas filas de espera para tratamento pelo SUS são desanimadoras. “Fomos rejeitados várias vezes por não nos encaixarmos no perfil do SUS, um serviço que devia ser universal, mesmo sendo uma paciente que, no momento, não tem condições de arcar com o tratamento”, reclama.

Pará avança a passos curtos na área da genética


Em 15 anos de trabalho, o Laboratório de Erros Inatos do Metabolismo (LEIM) da UFPA atendeu quatro mil famílias e fechou o diagnóstico de cerca de 200 casos. O biomédico Luiz Carlos Santana chefia o LEIM, é presidente da Regional Norte e Nordeste da Sociedade Brasileira de Genética Médica e coordena um projeto de extensão que investiga doenças raras. “Além de identificar as enfermidades, fazemos o aconselhamento genético das famílias, ajudando-as a saber se têm chance de ter outros filhos com a mesma doença. O Pará está avançando na área, mas ainda é a passos curtos. Precisa ter mais agilidade por parte do governo para se organizar”, opina.
De acordo com ele, 60% da demanda que chega ao LEIM é de Belém e o restante se divide entre outros municípios paraenses e até do Maranhão. “Conseguimos expandir o nosso trabalho a duras penas. O diagnóstico é feito de forma totalmente filantrópica, com verba do CNPQ. Algumas coisas, como luvas, temos que tirar do próprio bolso”, frisa. O laboratório tem parceria com uma rede nacional, enviando exames para outras instituições caso ainda não seja possível realizar localmente.
“Estamos em um período difícil, com muitos cortes de verba. Usamos materiais muito caros e, sendo efetivada a portaria, o recurso que chegaria aos hospitais de referência e depois seriam repassados para nós, ajudaria bastante”, completa. A neuropediatra Helena Feio integra o time do Serviço Caminhar, no Bettina Ferro, e fala do longo caminho a ser percorrido na área. “Muitos médicos da rede básica não têm informação e não pedem os exames corretos. Ainda tem muitos testes que são enviados para fora do Estado, precisamos investir para melhorar esse cenário”, salienta. 
Em função do feriado de Carnaval, a equipe de reportagem não conseguiu encontrar um representante da Sespa para falar sobre a implantação da portaria 199/2014.