sábado, 12 de dezembro de 2015

Intercâmbio social transforma vidas

*Publicado na página Responsabilidade Social, no jornal O LIBERAL de 15/10/2015

BRENDA PANTOJA
Da Redação

Dos 63 países analisados pela instituição Education First no Índice de Proficiência em Inglês, o Brasil ficou com a 38ª posição. A pesquisa foi divulgada no ano passado e mostra que o país tem baixa proficiência, mesmo tendo evoluído consideravelmente nos últimos sete anos. Dentre os estados brasileiros, o Pará ficou em 20º lugar, com índice avaliado como “muito baixo”. Dominar outro idioma é importante para o currículo profissional e também tem grande impacto social. É pensando nisso que várias instituições se dedicam ao ensino voluntário de línguas estrangeiras a crianças e adolescentes que moram em bairros periféricos de Belém.
Aos 14 anos, Diego Matheus já decidiu que vai aprender a falar espanhol fluentemente e também estuda inglês, disciplina na qual tem um bom rendimento na escola. “Gosto mais de espanhol, acho mais legal e me identifico mais com a língua. Quero fazer um curso no futuro”, conta o garoto, que cursa a sexta série. Além das aulas no colégio, ele frequenta as aulas promovidas pela organização não-governamental Aiesec, em parceria com o Lar Fabiano de Cristo (LFC), no bairro do Guamá. Foi lá que teve a oportunidade de reforçar o aprendizado do inglês, bem como entrar em contato com o espanhol.
O LFC é um dos parceiros locais que recebe intercambistas. Eles permanecem de seis a oito semanas na capital paraense, dando aulas de inglês ou espanhol para os meninos e meninas. A iniciativa é da Aiesec, uma entidade global formada por universitários e recém-formados que trabalha o conceito de intercâmbio social, com o objetivo de promover a liderança entre os jovens participantes e de fazer a diferença na comunidade onde eles são inseridos. A ONG está presente em mais de 120 países e promove projetos educacionais, ambientais e de marketing, além dos intercâmbios corporativos, de atuação profissional.
Julia Wohland, 22, é estudante de Química na Alemanha e passou os últimos dois meses na capital paraense ensinando inglês para as crianças e adolescentes atendidos pelo Lar Fabiano de Cristo. Para ela, a experiência foi engrandecedora. “O projeto é muito bom para eles, que podem conhecer outras culturas e aprender novas línguas. É ótimo ver que eu estou contribuindo para o desenvolvimento deles, os ajudando a terem chances de conquistarem mais, pois o inglês é um idioma global e muito importante”, comenta. Ela deixa Belém nesta semana, mas seguirá para Recife, onde participará de um projeto de educação ambiental da Aiesec. 
Os projetos sociais em que ela se envolveu não estão diretamente ligados à sua área de estudos, o que ela considera um ponto positivo. Julia deu aulas para duas turmas, totalizando quase 40 alunos, entre 7 e 17 anos, mas a quantidade depende da demanda das famílias atendida. 
A gerente de relacionamentos da Aiesec, Ewelin Gamelas, explica como a responsabilidade social construída no início da carreira pode gerar grandes resultados no futuro. “Empregamos muito o desenvolvimento de liderança entre os jovens. Mais do que atingir resultados, é preciso empregar a empatia e atuação social. Ao trabalharem para melhorar uma comunidade, se integrando a uma cultura diferente, plantamos uma semente”, afirma. A ideia é que estes jovens, ao assumirem posições influentes no mercado de trabalho, possam ter a consciência de trabalhar pela sociedade. 
Quatro intercambistas já passaram pelo LFC e marcaram o aprendizado não só do Diego, como também de Ismael Gomes, 15, e Breno Pantoja, 16. Por meio da parceria, eles já tiveram aulas de inglês e de espanhol, o que ajudou bastante no desempenho escolar. “A gente percebe que vários colegas têm muita dificuldade nessas matérias, enquanto a gente recebe um bom reforço com essas aulas. Na verdade, até muitos professores não têm facilidade nas línguas. É diferente o jeito que eles [intercambistas] ensinam, porque vieram de outro país”, observa Ismael.
Na escola, Breno aprende somente o espanhol e está fazendo planos para ingressar em um cursinho de inglês. Ele vai para o segundo ano do ensino médio e pensa na capacitação profissional. “Sei que o mercado de trabalho está competitivo e saber falar inglês é mais conhecimento, vai me ajudar lá na frente. Também treino karatê, já viajei para competir em outros estados e vai ser bom até para me relacionar com atletas estrangeiros”, avalia. Ampliar os horizontes destes alunos é uma das grandes vantagens do projeto. 
A coordenadora pedagógica do LFC, Débora Pedroso  destaca o protagonismo dos participantes do curso. “Por oferecermos educação informal, não há a obrigatoriedade das avaliações, o que deixa os alunos livres para participarem  por interesse próprio. E eles fazem questão de participar, de interagir com os intercambistas. O aprendizado deles é forte, porque se relacionam com um professor de fora”, pontua.
As duas ONGs vão estudar a possibilidade de abrir os cursos para membros da comunidade em geral. Saindo de Belém, 43 jovens já fizeram intercâmbio pela Aiesec desde 2012, quando a ONG chegou ao Pará. Outro escritório também funciona em Santarém. Em Belém, eles também têm parcerias com a creche Cordeirinhos de Deus, Associação de Moradores do Benguí e empresas.

Aprender alemão vira brincadeira de criança para grupo de 38 meninas

A pronúncia da língua alemã, que parece complicada para muita gente, vira brincadeira de criança para o grupo de 38 meninas, entre 6 e 12 anos, que participam do projeto “Competência Social e Interculturalidade no Ensino - Aprendizagem da Língua Alemã na Amazônia”, da Faculdade de Línguas Estrangeiras Modernas (Falem) da Universidade Federal do Pará (UFPA). Coordenado pela professora Rosanne Cordeiro de Castelo Branco, as aulas são realizadas na Instituição Pia Nossa Senhora das Graças, que assiste a 330 crianças de vários bairros de Belém, incluído meninas em situação de vulnerabilidade social. 
A professora e as cinco bolsistas que compõem a equipe buscam relacionar o idioma a elementos da cultura regional. “Aproveitamos datas comemorativas, como o dia do índio, do meio e ambiente, Natal, Círio e outros temas, como as lendas amazônicas para ensinar as palavras correspondentes em alemão”, detalha Rosanne. Trabalhando o alemão em conjunto com a realidade das alunas, o aprendizado se mostra eficiente. Ela ressalta que, além de ajudar as crianças a desenvolverem a competência de se comunicar em alemão, o projeto trabalha a valorização cultural.
“É comum as pessoas estranharem o ensino do alemão no Norte do país, mas as garotas aprendem uma nova língua, o que é muito bem visto no mercado de trabalho. Mesmo que elas sejam novas, a noção básica do alemão pode incentivá-las a continuar o aprendizado, uma vez que o projeto também aumenta a autoestima e a confiança delas”, frisa. As professoras fazem o contraponto de valores literários, estéticos e culturais da Amazônia e de aspectos artísticos e culturais da Alemanha. Este processo possibilita à criança o reencontro com a identidade e com a etnia, através do trabalho de gênero e de busca de respeito a si e ao outro, reforçando a igualdade de direitos e deveres do cidadão. 
Os conteúdos são ministrados durante o ano letivo, período suficiente para que as meninas construam um vocabulário razoável. Algumas, conforme o interesse e a disponibilidade, conseguem permanecer por vários anos no projeto, ampliando as habilidades na língua alemã. O projeto começou em 2000, mas teve uma pausa e foi retomado em 2008. Desde então, já atendeu 340 crianças carentes. O envolvimento dos alunos da Licenciatura de Língua Alemã é um dos pontos fortes do projeto, no entendimento da coordenadora. “Este trabalho permitiu o amadurecimento de muitos estudantes locais. Alunos e profissionais que vêm da Alemanha para pesquisar e atuar na UFPA sempre procuram se envolver com o projeto, em uma troca que tem se mostrado maravilhosa”, conta.

Projeto “Guamá Bilíngue” atua há seis anos com estudantes do bairro

Voltado ao espanhol e também da UFPA, o projeto “Guamá Bilíngue” atua há seis anos com estudantes do bairro. Participam 35 alunos das escolas estaduais Alexandre Zacarias de Assumpção e Barão de Igarapé Miri, todos entre 15 e 18 anos. Estudar uma língua estrangeira se tornou uma grande ferramenta de “letramento crítico”, de acordo com  a professora Cássia Paiva, responsável pelo grupo. O curso dura um ano e consegue que  os integrantes dominem o básico do espanhol, seguindo o padrão europeu de ensino.
Os alunos participam das aulas no campus da Universidade e realizam atividades textuais que servem de base para discussões. “Abordamos temas como assédio, violência contra mulher, alcoolismo, entre outros. Muitas vezes, a conversa não fica só nas lições sobre a língua, mas passa para a consciência social. Eles passam a compreender melhor situações de risco e a construir melhor a cidadania. Nossa intenção também é dar letramento crítico, ou seja, uma leitura de mundo diferente da que eles estão acostumados”, assegura.
Mais de 20 trabalhos acadêmicos  foram elaborados com base no projeto e os estudos mostram que os alunos tiveram avanços significativos não só no domínio do espanhol,  mas também do português. Ao final do curso, os alunos recebem um certificado oficial do Instituto Cervantes, da Espanha. Leandro Silva, 19, participou do projeto em 2013 e foi o primeiro integrante a ser aprovado no vestibular da UFPA, em seguida. “O espanhol foi muito importante na minha vida, pois me ajudou a realizar a prova do Enem, onde optei por essa língua, fazendo com que eu conseguisse uma vaga na UFPA no curso de Ciência da Computação. Até hoje o espanhol está me ajudando, pois me deparo bastante com artigos, livros, video-aulas que se utilizam da língua espanhola”, relata.
A impressão deixada pelo curso em Leandro é um dos objetivos do projeto. Cássia salienta que, ao se deslocarem à UFPA para participar do projeto, eles são retirados de um ambiente de vulnerabilidade
e introduzidos ao espaço da universidade. “Isso os instiga, abre os seus olhos para as oportunidades do futuro. Ensinar outra língua abre portas para uma cultura diferente e o aluno percebe que pode ir além dos limites que lhe são apresentados”, resume. Pelo trabalho desenvolvido com o “Guamá Bilíngue”, a professora recebeu recentemente o “Prêmio Palma de Ouro Barroca de Minas Gerais”, destinado às mulheres de grande atuação nas áreas de Turismo, Cultura e Educação.

Serviço:
• Conheça mais sobre a AIESEC: www.aiesec.org.br/
• Saiba mais sobre o projeto “Aprendendo Alemão na Amazônia”: http://amazonienkinderdeutschlernen.blogspot.com.br/
• Mais informações sobre o projeto “Guamá Bilíngue”: www.facebook.com/GuamaBilingue


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