domingo, 14 de dezembro de 2014

Seurb vai mapear imóveis abandonados

*Publicado em O LIBERAL de 24/11/2013

BRENDA PANTOJA
Da Redação
   
    Três imóveis estão abandonados na rua Jerônimo Pimentel e são motivo de preocupação para os vizinhos. Os locais tornaram-se abrigo para moradores de rua e acumulam lixo, aumentando a proliferação de ratos e insetos. As casas ficam entre as travessas Marquês de Pombal e Soares Carneiro, mas a situação se repete em diversos pontos de Belém. O Código de Posturas do Município de Belém obriga os proprietários a manterem limpos os terrenos imobiliários e, caso não estejam habitados, o acesso público à propriedade deve ser impedido. Para identificar esses pontos, a Secretaria Municipal de Urbanismo (Seurb) iniciará, ainda esse ano, um levantamento em todo o município.
          Atualmente, a prefeitura depende de denúncias da população para chegar a esses locais e, ainda assim, os pedidos de limpeza se concentram na Secretaria Municipal de Saneamento (Sesan), que possui um canal telefônico específico para esse tipo de reclamação. Para denunciar abandono de imóveis à Seurb, é necessário ir ao prédio do órgão e protocolar a queixa, o que desestimula muita gente. “Temos a proposta de criar um meio de concentrar essas denúncias e estamos trabalhando em um canal, que pode ser por telefone ou internet, mas a ideia é combater essa prática com uma ação conjunta de vários órgãos”, anunciou o titular da Seurb, Adinaldo Souza de Oliveira.
        Além das secretarias de Urbanismo e de Saneamento, o projeto envolve a Secretaria Municipal de Finanças (Sefin), a Companhia de Desenvolvimento da Área Metropolitana de Belém (Codem) e a Fundação Papa João XXIII (Funpapa). “A Sefin nos ajudará a saber a situação cadastral de cada imóvel, bem como dos proprietários, enquanto a Codem auxiliará no mapeamento georreferenciado das áreas com mais ocorrências. A Funpapa vai atuar junto aos moradores de rua que geralmente ocupam esses terrenos”, detalhou.
         O objetivo é trabalhar de forma global e não pensar apenas em ações isoladas. Trabalhando em parceria, os órgãos irão notificar os proprietários, aplicar multas, realizar ações de limpeza e desocupação, ou, em casos mais extremos de descaso, buscar judicialmente a desapropriação da
área. “Uma das razões mais comuns para tantas propriedades serem abandonadas é a especulação imobiliária. Os donos não têm interesse em fazer reparos esperando que a área valorize”, afirmou.
         Batalhas judiciais também são motivos comuns, como no caso de uma das casas na Jerônimo Pimentel. De aparência clássica e completamente construída, o imóvel de número 934 já foi saqueado. Sem portas nem janelas e cercada pelo mato, a propriedade definha por causa de um conflito por herança de família que se arrasta ao longo dos anos, segundo os moradores próximos. O mesmo quadro é visível nas casas de número 918. A universitária Angélica Monteiro, 20, mora a uma casa de distância dos terrenos abandonados e já foi assaltada cinco vezes no portão de sua residência. “A insegurança aumentou bastante há cerca de três anos, quando abandonaram de vez a área. Eu evito andar por essa calçada. Duas mulheres já foram violentadas lá dentro”, reclamou.
          O lixo está espalhado por toda a parte, até mesmo na calçada, que também foi danificada. “A polícia já foi acionada várias vezes, mas eles apenas tiram os mendigos, que em pouco tempo retornam. Dos donos não se tem nem notícia”, contou. De fato, os portões dos imóveis não impedem o acesso, o que põe em risco a vida de quem mora ao lado. O webdesigner Rônis Oliveira, 34, mora em uma vila próxima, mas os fundos da casa são colados ao quintal dos imóveis abandonados, o que o obrigou a levantar o muro para evitar invasões e contratar um dedetizador. “A quantidade de mosquitos, ratos, baratas e até carrapatos incomoda demais e afeta diretamente a saúde da minha família. Eu e meu filho desenvolvemos alergias por causa disso”, queixou-se. 
           Na avenida Fernando Guilhon, entre as travessas Generalíssimo Deodoro e 14 de Março, uma casa está com o chão totalmente recoberto de lixo e entulho e o abandono já dura tanto tempo, que algumas espécies de árvores cresceram na laje. O imóvel está abaixo do nível do asfalto e segundo João Batista, 77, esse foi o problema inicial dos antigos moradores, há 15 anos. “Quando a rua foi aterrada, a casa alagava muito e a estrutura ficou comprometida. Como o terreno era da Caixa Econômica, mas a casa foi construída pelos compradores, nunca ficou decidido quem pagaria pelo prejuízo”, explicou. Ele ressalta que a história é antiga e ninguém mais tem contato com os donos do imóvel. 
         Enquanto a solução não chega, a maior prejudicada é a família da professora Bernadete Tavares de Souza, que é vizinha do local. “As pessoas não jogam só entulho, também jogam lixo doméstico, que atrai bichos. Virou criadouro de mosquito da dengue, moradores de rua se reúnem durante a noite para consumir drogas, fazem necessidades e o cheiro fica insuportável”, criticou. Para minimizar o incômodo, eles precisam espalhar veneno pelo quintal e manter as janelas fechadas. Os portões e grades de ferro da antiga construção foram levados. Vizinhos e até moradores de outra rua acostumaram-se a jogar lixo em todo o terreno, sem se preocupar com o prejuízo que a prática acarreta. “Quando chove, parte desses resíduos é arrastada para a rua, entupindo os bueiros. Ligamos pra Sesan e até pra Sesma, por causa dos focos de dengue, mas nada de concreto é feito”, acrescentou.
       Adinaldo Oliveira reconhece que “não havia” ação clara e definida no sentido de solucionar esses impasses, mas o mapeamento, segundo ele, será fundamental na elaboração de um plano de ação. “Os técnicos de levantamento irão às ruas para fiscalizar setor por setor, o que possibilitará visualizar espacialmente o cenário e agir de forma coordenada, com a intenção de reduzir o impacto dessa infração para a população”, complementou.

domingo, 16 de novembro de 2014

Icoaraci perde legado dos seus casarões

*Publicado no jornal O LIBERAL de 27/10/2013

BRENDA PANTOJA
Da Redação

     Quem visita a antiga casa do poeta paraense Antônio Tavernard, em Icoaraci, encontra o abandono. A placa em frente informa que se trata de um “casarão antigo do século passado”, mas está em ruínas e tomado pelo mato. A situação se repete com outras construções históricas do distrito, que se 
deterioram sem restauração. A Fundação Cultural do Município de Belém (Fumbel) diz que planeja um novo inventário do patrimônio histórico e arquitetônico no próximo ano. O último, de 1994, está desatualizado, segundo a presidente da fundação, Heliana da Silva Jatene.
     A antiga Estação de Trem e o Chalé Tavares Cardoso, que abriga a biblioteca Avertano Rocha, também estão em péssimo estado de conservação. A Associação dos Agentes de Patrimônio da Amazônia (Asapam), coordenada pelo historiador e especialista em patrimônio cultural Jeancarlo Pontes Carvalho, reúne informações sobre o estado desses e de outros imóveis históricos, repassa aos órgãos competentes e cobra melhorias. Recentemente, a denúncia de que um casarão na rua Manoel Barata, entre as travessas Berredos e Andradas, seria demolido para a construção de um supermercado foi divulgada na página da entidade e teve ampla repercussão nas redes sociais. “Não há imóvel histórico com autorização para ser derrubado em Icoaraci, no máximo o local pode ser revitalizado”, rebateu a presidente da Fumbel. 
     Jeancarlo observa que os casarões de Icoaraci fazem parte da história do Pará. “Infelizmente, os casarões históricos da vila, assim como a grande maioria em todo o Pará, padece o descaso da sociedade, é provável que 90% estejam em péssimas condições”, avalia, ao citar a antiga Estação de Trem. A fachada indica que uma Cooperativa de Artesãos funcionou no local, mas o prédio permanece com as janelas e portas trancadas, cercado pelo mato alto. Vizinhos afirmam que uma família sem-teto ocupava o imóvel. Revitalizar os bens patrimoniais reforça a grandiosidade da cultura paraense, defende Jeancarlo. “A importância da preservação é deixar às próximas gerações essa herança, legado de um passado importante ao desenvolvimento da nossa cidade”, definiu. Ele e a presidente da Fumbel sustentam a necessidade de um relatório atualizado que possibilite acompanhar a situação dos imóveis.
     “O Chalé Tavares Cardoso é o exemplo mais notório de abandono. Está cheio de infiltrações, rachaduras e algumas estruturas da casa ameaçam desabar”, denuncia Jeancarlo Carvalho. O prédio é tombado pelo município, mas o terreno ao lado, constantemente alagado, pode prejudicar as fundações da casa. A situação piorou depois que uma construção irregular em frente ao chalé obstruiu o escoamento da água do esgoto e da chuva, fazendo ela se acumular na propriedade histórica. 
       As obras para uma nova galeria subterrânea que comporte o fluxo do terreno deverão começar até o final do ano, anuncia Heliana Jatene. Segundo ela, a Fumbel pediu apoio à Secretaria Municipal de Saneamento (Sesan) para solucionar o problema. “O chalé precisa de providências imediatas de restauração, mas a Sesan informou que não adiantava bombear a água novamente, por isso estão estudando para definir a melhor maneira de escoar”, acrescentou. Ela explicou que a Prefeitura não conseguiu incluir o chalé entre os patrimônios tombados pelo Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Iphan), que não aceitou a proposta sob a alegação de que o imóvel não faz parte do centro histórico de Belém. 
        “Este casarão, sem dúvidas, está com os dias contados. Se as secretarias responsáveis ficarem de braços cruzados, é provável que, em alguns anos, ele tombe, literalmente”, critica Jeancarlo. A indignação dos integrantes da Asapam se estende ainda à casa Senador José Porfírio, com traços do Art Nouveau que marcou o final do século XIX em Belém, mas hoje com a estrutura danificada, mato
e lixo ao redor. Ele defende que os espaços sejam transformados em pólos culturais e turísticos. “Os casarões são a prova material da nossa história e testemunho dos períodos da Belle Époque e o ciclo
da borracha que se desenvolveu no Pará”, argumenta. 

INVENTÁRIO
     “A atual gestão recebeu a Prefeitura sem informações sobre os bens patrimoniais do município. Para fazer esse acompanhamento é necessário elaborar um inventário e essa é a prioridade da Fumbel no momento”, informou Heliana Jatene. A ideia é convocar os cursos de Arquitetura, da Universidade Federal do Pará (UFPA) e Universidade da Amazônia (Unama), para auxiliar na elaboração do inventário, que vai abranger Belém, Icoaraci, Mosqueiro e Cotijuba. Ela informou que a proposta já foi enviada às instituições, mas não houve resposta. Não há um prazo para se iniciar o projeto e ainda será definido quais serão as atribuições de cada órgão, mas a expectativa é iniciar o levantamento no ano que vem. “No entanto, não é uma tarefa fácil e nem rápida. Somente depois do trabalho concluído poderão ser providenciadas licitações para restaurar os imóveis”, ressaltou.
     A casa do poeta Tavernard, de acordo com a Fumbel, está em processo de tombamento pelo município. “O abandono muitas vezes ocorre pela falta de atitude dos proprietários. É bom lembrar que o Ministério da Cultura oferece um financiamento para os donos de imóveis históricos”, pontuou Heliana, ao apontar as denúncias de abandono e depredação como a principal forma de ajudar a Fumbel a preservar o patrimônio. As informações podem ser fornecidas pelos telefones 3230-3684 ou 8733-3929.

quarta-feira, 5 de novembro de 2014

Círio de Vigia emociona 250 mil fiéis

*Publicado no jornal O LIBERAL de 09/09/2013

BRENDA PANTOJA
Da Redação

      Aproximadamente 250 mil fiéis lotaram as ruas de Vigia, ontem, para participar do Círio de Nazaré, que chegou à 316ª edição e é considerado o círio mais antigo do Pará. A diretoria da festa calcula que cerca de 300 mil pessoas circularam pela cidade durante os três dias de festividade, que teve como tema “Pela fé, como Jesus e Maria, sejamos obedientes ao Pai”. História e devoção se unem à tradição da romaria, que cresce a cada ano, mas mantém algumas raízes da simplicidade de sua origem. Uma delas é o Carro dos Fogos, que é puxado por um búfalo e abre a procissão com queima de fogos; o Anjo do Brasil, uma garota vestindo  as cores da pátria e carregando a bandeira brasileira; e ainda a apresentação de bandas de música locais.
A programação iniciou-se com uma missa às 6 horas da manhã na Igreja de São Sebastião, no bairro de Arapiranga, ponto de partida da romaria. A igreja tem capacidade para 400 pessoas e ficou completamente lotada. “Para acomodar melhor o número cada vez maior de devotos estamos fazendo uma reforma de ampliação. No entanto, a obra ainda não tem previsão de conclusão, pois depende dos recursos arrecadados pela paróquia”, ressaltou o pároco José Carlos Silva da Cruz, que celebrou a missa. É o primeiro ano em que o padre participa da organização e diz que se sentiu honrado com a responsabilidade de ajudar a promover uma festa dessa importância para a cidade e para o estado.
A saída da imagem atrasou e ocorreu às 9 horas, mas não comprometeu o cronograma, que foi cumprido com a chegada da imagem na Igreja Matriz às 11h45. Logo em seguida iniciou-se a celebração da missa festiva que encerrou as atividades de ontem. Por onde passava Nossa Senhora de Nazaré era saudada com orações e emocionava os devotos. Mutios choravam. A imagem estava envolta em um manto em tons de branco, azul e dourado e abrigada na berlinda decorada com rosas vermelhas.
A coordenadora geral do Círio, Licely Magalhães, citou o novo carro que conduz o andor. “O veículo antigo foi trocado por estar danificado e para evitar que comprometesse o andamento do cortejo, pois o Círio é composto de cinco estações além da berlinda”, contou. A romaria tem ainda as barcas de São João, São Pedro e São José, que levam as crianças vestidas de marinheiros, a barca dos Milagres, que recolhe os votos atendidos dos promesseiros  e o Carro dos Anjos. O percurso foi de quase quatro quilômetros e 400 metros de corda foram levadas pelos romeiros até o final, quando ela foi cortada e repartida entre os fiéis.
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A Polícia Militar não registrou nenhuma ocorrência, segundo o major França do 12º Batalhão. “Nós disponibilizamos 50 policiais para a procissão, além do apoio de outras guarnições”, informou. Ao todo, o efetivo foi de 100 policiais, além dos 300 agentes da Guarda da Santa. No decorrer da procissão, 12 pessoas foram atendidas por desmaio e duas por arritmia cardíaca, de acordo com o comandante Pinheiros do Corpo de Bombeiros, que trabalhou com 20 militares e teve com a colaboração de 20 voluntários da Cruz Vermelha. “Muitas pessoas vem sem a alimentação adequada, que deve ser reforçada principalmente para quem vai na corda. O forte calor e a falta de hidratação também contribuem
para o acometimento de mal súbito”, explicou.
O autônomo Antenor Moraes, 48, tomou todos os cuidados necessários para acompanhar a romaria na corda e cumprir a promessa em agradecimento ao reestabelecimento da sua saúde. Há três anos ele começou a sentir pontadas no peito, mas nenhum exame diagnosticava o problema, até que resolveu pedir a cura a Nossa Senhora e as dores passaram. “O círio já tinha um significado especial, mas na corda é mais emocionante, mais gratificante, pois fortalece a fé”, afirmou. Logo no início da procissão, o tempo fechou por alguns minutos e ameaçou chover, mas a multidão só aumentava a cada trecho e a partir da metade da procissão o clima voltou a esquentar, fazendo as pessoas seguirem com sombrinhas e leques para se protegerem do sol e do calor.
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Os devotos iniciaram a caminhada  na rua São Sebastião e seguiram para a avenida Santana de Medeiros, avenida Barão de Guajará, travessa Vilhena Alves, rua Nazaré, travessa Hilário Cardoso e a avenida professora Noêmia Belém, para chegar à Igreja Matriz. Em todas as vias as janelas das casas estavam abertas e as fachadas decoradas para homenagear a santa. Faixas, flores, balões e berlindas coloriram as ruas centenárias de Vigia e simbolizaram o carinho da população a Nossa Senhora. A ornamentação especial para a ocasião faz parte da comemoração na família da professora Celeste Barbosa, 68. De cada lado do portão ela posicionou duas réplicas em tamanho menor da berlinda com a imagem, cercada de adornos. “Todo Círio a casa é enfeitada para acompanharmos a passagem da santa e depois acontece reunião em família para, em média, 50 pessoas”, disse.
Para ela, que é historiadora e devota, o Círio de Vigia é duplamente importante. “A relação de fé da população daqui é ainda mais antiga que em Belém, e já era expressada antes mesmo das romarias serem nomeadas  de Círio. A cidade de Vigia é mariana e essa essência passa de geração em geração  sem se perder, pelo contrário, só se multiplica”, observou. A professora reforçou a mensagem transmitida durante a festa religiosa, que ”consiste em promover um momento de reflexão individual, mas sem esquecer o amor ao próximo”.
            A adolescente Dayane Nunes, 17, participou do percurso pela primeira vez e estreou de uma forma muito bonita: tocando saxofone na Banda Sinfônica Maestro Vale, uma das que acompanha a romaria. “Futuramente tenho vontade de ir na corda, mas só tocar em honra a Nossa Senhora já é um grande privilégio”, comentou animada. Ela está em ano de vestibular, pretendendo ingressar no curso de Música, e aproveitou para pedir a aprovação no processo seletivo, com a promessa de continuar acompanhando a procissão daqui para frente. “Foi um mês de ensaio puxado, mas deu para conciliar com os estudos e o esforço de tocar durante todo o trajeto vale a pena, é um jeito de ser grata à santa”, completou.
            Esta edição do Círio também foi marcante para a lavradora Nair de Sousa, 53. Os braços levantados e a   maquete de uma casa em cima da cabeça simbolizam a compra da casa própria, uma vitória esperada há muito tempo. “Sou bragantina e frequentava o Círio de lá, mas há oito anos me mudei para cá e participo sempre, pois a devoção é a mesma em qualquer lugar”, declarou. Para ela, o sentimento é uma mistura de felicidade, orgulho e devoção por poder cumprir uma promessa feita há muito tempo.
            Na família da agricultora Maria Gracinete Paes, 32, a devoção foi compartilhada. No ano passado, o filho  mais velho dela sofreu um acidente e precisava fazer duas cirurgias. “Foi quando a minha caçula ficou muito preocupada e prometeu à Nossa Senhora que se ele ficasse bom rapidamente ela iria como anjinho no próximo Círio”, complementa a mãe. O pedido foi atendido e o Lucas, de 14 anos, teve uma recuperação ótima sem necessidade da segunda operação. A pequena Lívia, 6, honrou a promessa e participou do Carro dos Anjos, acompanhada de perto da mãe e do irmão.
            Andrey Miguel, de apenas 4 anos, acompanhou o Círio pela primeira vez e de maneira especial. Ele e mais dois primos estavam no carro dos marujos, com roupas de marinheiros. “Eu e minha irmã decidimos colocá-los para participar no carro em agradecimento ao ano passado, em que muitas bênçãos foram recebidas”, justifica a mãe dele, a autônoma Andréa Torres, 30. É também a primeira vez que a família faz o trajeto toda junta e ela acredita que a experiência será positiva para as crianças. “É importante para que eles aprendam desde cedo o valor da fé e se tornem pessoas de bem. O Andrey até participa do catecismo mirim em uma paróquia daqui. Sem falar que eles se divertem”, brincou, apontando para os meninos que riam em cima do carro.
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            O Círio de Vigia atrai devotos de outras localidades que vão a Vigia louvar Nossa Senhora de Nazaré, como é o caso da funcionária pública Lucimir Lira, de 51 anos. Ela é moradora de Mosqueiro e acompanha a procissão no município há sete anos. “Antes tinha o costume de participar da romaria de Nossa Senhora do Ó (realizado no distrito) e do Círio em Belém, mas vi no Círio daqui uma oportunidade a mais de agradecer as graças recebidas na família. A festa aqui também é muito bonita”, elogiou. Ela foi para Vigia com um grupo de 30 pessoas, entre parentes e amigos, e alugou uma casa para poder aproveitar bem todos os dias da festa.
A professora Ana Pantoja, 63, apesar de ser natural de Vigia, só acompanhou o Círio até os 18 anos de idade, quando se mudou para a capital paraense. Com saudade da festividade, ela voltou a frequentar o Círio na terra de origem desde o ano passado. “Quando saí daqui, a festa já era grande e tradicional, mas desde então a fé da população tem crescido e agregado mais valor ainda ao Círio”, observou.
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O Círio também é oportunidade de trabalho para muitas pessoas, principalmente camelôs. O ambulante Assis Ferreira, 48, se deslocou de Belém para a cidade para vender toalhinhas decoradas especialmente para a festividade. “Trouxe mil unidades que começaram a ser confeccionadas em maio, com a ajuda da minha esposa e filho”, relatou. Apesar do esforço para vender toda a mercadoria nos três dias do evento, ele disse que sempre sobram cerca de 50 unidades e que ao acompanhar a procissão trabalhando, é impossível não se comover. “Aproveito para agradecer pela saúde da minha família, pela disposição para batalhar pelo meu sustento”, acrescenta ele, que costuma viajar para as maiores romarias do Pará  vendendo as toalhas.

terça-feira, 28 de outubro de 2014

DPVAT evidencia violência no trânsito


*Publicado no jornal O LIBERAL de 22/09/2013

BRENDA PANTOJA 
Da Redação

           No primeiro semestre deste ano, R$ 1, 56 bilhão foi  pago pelo Seguro de Danos Pessoais Causados por Veículos Automotores de Via Terrestre (DPVAT) a vítimas de acidentes de trânsito em todo o País. São indenizações por morte, invalidez permanente e reembolsos de despesas médicas e hospitalares para 299 mil pessoas. A quantia é 38% maior que a paga no mesmo período do ano passado. O Estado concentrava, até junho, 3,42% das indenizações no País, com 992 benefícios, segundo o Sindicato dos Corretores e das Empresas Corretoras de Seguros (Sincor/PA) e da Seguradora Líder, que administra o seguro DPVAT. A preocupação é que, até dezembro, a frota de veículos deverá chegar a 500 mil na Região Metropolitana de Belém, de acordo com Carlos Valente, coordenador de planejamento do Detran).
       Em 2011, o Pará teve 1.124 mortes no trânsito e ultrapassou os 46 mil acidentes, com o consumo de álcool aparecendo como possível causa em 325 casos. Valente ressalta, contudo, que a embriaguez também está relacionada a manobras irregulares, avanço de sinal, falta de atenção, excesso de velocidade e outros motivos. “A bebida alcoólica é uma das principais causas de vítimas fatais no trânsito, com quase 50% das mortes no País, e no Pará não é diferente”, pontua. Entre janeiro e maio deste ano, o Detran registrou 10.782 ocorrências do tipo “dirigir sob influência de álcool” em todo o Estado. Só em Belém, no mesmo período, foram 1.646 autuações dessa categoria.
A maior concentração de ocorrências está nas rodovias BR 010, 316 e 163, vias que são perigosas naturalmente. O assunto é discutido durante a Semana Nacional do Trânsito (SNT), que vai até quarta-feira e debate o tema “Álcool, outras drogas e a segurança no trânsito: efeitos, responsabilidades e escolhas”. “O número de autuações seria ainda maior se tivéssemos mais equipamentos para fazer a aferição da taxa de álcool no organismo no condutor”, afirma Valente, que defende a prevenção de acidentes para desafogar o sistema de saúde. “Muitas vezes um paciente em situação menos grave não consegue atendimento por falta de leito, ocupado por um acidentado de trânsito”, exemplifica. Do montante arrecadado pela seguradora Líder, 45% é repassado ao SUS, o equivalente a R$ 2,2 bilhões nos primeiros seis meses de 2013.
Somadas todas as categorias de veículos cobertas pelo seguro (carros, motos, ônibus e caminhões), foram pagas 29.025 indenizações por morte, 215.530 indenizações por invalidez permanente e 54.735 reembolsos de despesas médicas e hospitalares. O relatório publicado pela seguradora Líder aponta que do total de pessoas que sofrem algum tipo de dano em acidentes de trânsito, 70% estão na faixa etária de 18 a 44 anos, ou seja, a que concentra a maior parcela da população economicamente ativa do País. “É uma população que tem acesso à informação e é esclarecida, mas insiste em dirigir sem habilitação e embriagado”, critica.
Carlos Ubirajara, 44, é um dos mais de 215 mil brasileiros indenizados por invalidez permanente. Em um acidente, em setembro do ano passado, ele perdeu a visão no olho esquerdo e ficou com menos de 10% de visão no olho direito. Ele trabalhava como  metrologista e fazia uma viagem a trabalho pela rodovia PA-150, quando uma carreta freou após uma curva, para desviar de um buraco, e ele não conseguiu evitar o choque. “Estava com o cinto, mas o impacto foi tão forte que perdi a visão na hora. Fui levado para o pronto socorro de Tailândia, mas o hospital não tinha condições de me tratar e me transferiram para Belém, numa agonia que durou quase 10 horas”, recorda. Somente seis meses depois, ele recebeu o DPVAT, no valor de R$ 13.500, de duas vezes, após enfrentar muita burocracia.
Em Belém há 26 pontos autorizados para solicitar o seguro. Ubirajara recomenda que o segurado ou a família liguem para os postos de atendimento e confirmem a documentação necessária para evitar transtornos. “Foram cobrados vários documentos que deveriam ter sido emitidos no local do acidente; precisei de diversos laudos para comprovar que os dois olhos tinham sido afetados e receber a indenização integral”, conta. Ele era temporário na empresa e se aposentou por invalidez pelo Instituto Nacional do Seguro Social (INSS) no final de outubro, ainda a tempo de fazer duas cirurgias. “Ficou faltando uma operação no nariz; fiquei praticamente sem olfato depois do acidente, mas não tenho recursos para pagar a cirurgia”, lamenta.
Mesmo com 18 anos de experiência dirigindo na estrada, Ubirajara foi vítima das péssimas condições das rodovias no estado. “No começo, disseram que perderia a visão, mas hoje consigo enxergar com a ajuda de um óculos de 10 graus. E, principalmente, escapei da morte”, completa. A jovem Marina Holanda Silva de Lima não teve o mesmo destino. Aos 25 anos, morreu em um acidente no centro de Belém, em março de 2005. A mãe, Nádia Silva de Lima, 55, até hoje não sabe a causa da tragédia, que vitimou a filha e o namorado, quando saíam de uma festa. “Eles dirigiam de madrugada com frequência, sempre revezando a direção caso um tivesse bebido, mas nunca haviam se envolvido em acidente”, lembra. Um dos veículos, não sabe-se qual, avançou o sinal.
Os passageiros do outro carro não tiveram ferimentos graves. A família de Marina recebeu o DPVAT, na época no valor de R$ 10 mil. “Pelo que eu percebo, as pessoas em Belém ainda não entenderam que algumas atitudes são perigosas, põem a si mesmo e aos outros em risco e  podem acabar com a vida de pessoas queridas”, alerta.

FRAUDES

O Sincor/PA é um dos pontos autorizados do seguro DPVAT e no primeiro semestre já faz 1.726 atendimentos. O diretor do sindicato, Otávio Augusto Souza, avalia que a maior dificuldade é a divulgação dos direitos das vitimas de acidentes. “É essencial que os interessados busquem se informar para não caírem na armadilha de pessoas que tentam tirar vantagem”, orienta. A seguradora Líder intensificou  o combate à fraude no primeiro semestre deste ano, com comprovação de 2.473 tentativas de fraude, que poderiam ter gerado perdas  de até R$ 11,3 milhões. Dados coletados pela entidade mostram ainda que a motocicleta é o  veículo com maior incidência de acidente com vitimas, representando em média 66% das  indenizações entre os meses de janeiro a junho de 2012 e 2013 no Estado.
A seguradora Líder aponta que, embora as motocicletas representem 27% do total da frota de veículos do Brasil, elas correspondem a 62% do valor total pago e 71% da quantidade de vítimas indenizadas. “Foram 11.712 indenizações por morte em acidentes envolvendo motocicletas, o que representou 40% dos pagamentos por óbito do primeiro semestre de 2013. Em valores, essas indenizações chegaram a R$ 151,1 milhões”, informa o relatório disponível no site www.seguradoralider.com.br. A página na internet www.dpvatsegurodotransito.com.br também reúne informações sobre o assunto e o Sincor/PA fornece esclarecimentos pelo telefone 0800 7030993 ou assistência pessoal na sede, localizada na avenida Duque de Caxias, nº 295, entre as ruas  Domingos Marreiros e Antônio Barreto.

segunda-feira, 20 de outubro de 2014

Pai e filho compartilham mais que amor

*Publicado no jornal O LIBERAL de 11/08/2013

BRENDA PANTOJA
Da Redação    

    Pai e filho atendem pelo nome de Hélio Dourado. Na tentativa de especificar, não adianta chamar pelo "professor Hélio", pois os dois também compartilham a profissão. Além da relação familiar, os pontos em comum aproximam ainda mais Hélio Vieira Dourado, o pai, de 72 anos, e o filho Hélio Platilha Dourado, 30 anos. Por outro lado, as diferenças já podem ser vistas na sala de aula. O primeiro leciona as disciplinas de Física e Matemática enquanto o outro dá aulas de Português e Inglês. "Sempre tive facilidade em matérias de Humanas e passei arrastado em Física, acabava sendo a pior propaganda do meu pai", brinca Hélio.
    Ainda que hoje dividam a mesma paixão pelo magistério, eles chegaram à carreira por caminhos diferentes. "Quando soube que ele também queria ser professor tomei um susto, porque até então ele desejava ser médico e queria distância da profissão", lembra o pai. De fato, a decisão foi uma surpresa até para o filho, que tentou o vestibular para Medicina durante quatro anos. "Quando concluí meu curso de inglês fiz a seleção para ser professor, apenas como uma forma de ganhar dinheiro extra, mas acabei me encantando pela sala de aula e escolhi entrar na faculdade de Letras", conta. 
    Ele garante que a influência e o incentivo do pai foram fundamentais para a mudança de visão profissional. Hélio Dourado, o pai, começou a dar aulas muito jovem, aos 13 anos, antes mesmo de ser aprovado em Engenharia Civil. E lá se vão 59 anos, sete vezes mais tempo de experiência do que o filho. "Os mesmo alunos, às vezes até os filhos e netos deles, que passaram pelas aulas do meu pai agora chegam às minhas e é muito legal educar gerações diferentes ", afirma. Eles avaliam que o aprendizado é mútuo e contínuo. "Ser aluno do meu pai me ensinou muito sobre a postura do educador em sala, como abordar o conteúdo e os alunos", revela ele, ao que o pai responde: "e eu aprendi a analisar e entender o comportamento da juventude atual, levando as impressões de dentro de casa para a sala de aula". 
     Para ele, o magistério está no sangue. "Acho que é uma vocação hereditária, porque minha mãe era professora, meu tio e minhas irmãs também são", acredita o pai, que também casou com uma professora. Hélio, que é filho único, cresceu nesse meio e aprendeu a enxergar a profissão com carinho e a troca de conhecimento com o pai é enorme. "Frequentemente peço orientação a ele em relação a alguma turma ou projeto pedagógico, até pela questão do temperamento: eu sou muito explosivo e ele é mais analítico", admite. Em contrapartida, ele tenta ajudar o pai a lidar com ferramentas mais tecnológicas dentro e fora das salas. Hoje, o Dia dos Pais será comemorado com o tradicional almoço em família. 
     O filho se diz orgulhoso do nome similar, dado em homenagem ao pai e ao avô, e dos valores recebidos durante a criação. "Tudo o que eu sou em termos de princípios, respeito e bem-viver é reflexo da educação do meu pai", reconhece. A paternidade também trouxe sabedoria ao professor Hélio Dourado, figura respeitada nos colégios paraenses. "Mesmo das nossas incertezas e inseguranças durante o desafio de educar uma pessoa a gente tira muitos ensinamentos e fica a alegria de ver a pessoa extremamente honesta que formamos", elogia ele. Entre fórmulas da Física e textos da Literatura, pai e filho acreditam que falam a mesma linguagem e frisam que a admiração é recíproca. 
     A psicóloga Jesiane Calderaro, vice-presidente do Conselho Regional de Psicologia (CRP), explica porque, muitas vezes, os pais se tornam modelo e inspiração para os filhos. "Desde crianças a noção de valores inscrita e absorvida em nossa realidade psíquica sobre o pai tem o  significado  de que ele é aquele  suficientemente forte, que acolhe, que carrega no colo, que protege, sustenta, disciplina quando há necessidade e  que premia quando há merecimento", detalha. Com essa imagem em mente, a pessoa geralmente busca um caminho para despertar igual admiração no pai, mesmo quando adota uma atitude de confronto, fase observada principalmente durante a adolescência e juventude.
        "A discordância é saudável nas pequenas decisões, à medida que  se constituem  um treino para a posteridade, ocasião na qual a pessoa já adulta, e não poucas vezes,  terá que tomar decisões sozinha, ser convincente ou enfrentar diversas oposições", esclarece. Ela acrescenta que a análise se estende a outras referências paternas, que podem ser o avô, irmão mais velho, padrasto e, em alguns casos, até mesmo a mãe. A psicóloga atribui essa flexibilidade nos papeis familiares às atuais "reformulações na conjuntura social". 

quinta-feira, 9 de outubro de 2014

Site fornece rota dos ônibus em Belém

*Publicado no jornal O LIBERAL de 28/07/2013

BRENDA PANTOJA
Da Redação     

     Colaboração é a chave para o projeto Rota Urbana, que ajuda usuários de transporte coletivo a encontrarem o ônibus mais indicado para o trajeto que desejam. A informação vem através de um site que mostra mais de 80 linhas e seus respectivos percursos. A iniciativa foi desenvolvida por alunos dos cursos de Ciências da Computação e Sistemas de Informação da Universidade Federal do Pará (UFPA), pensando em suprir uma necessidade dos moradores da Região Metropolitana de Belém que enfrentam diariamente o trânsito caótico da cidade. Qualquer pessoa pode acessar a página na internet e contribuir com informações sobre um novo roteiro, corrigir dados ou fazer sugestões, baseando-se em um conceito chamado crowdsourcing. 
     O endereço do site é www.rotaurbana.net.br e um dos desenvolvedores, Adailton Lima, explica que a página está em fase beta, ou seja, sofrendo alterações frequentemente conforme as ferramentas são aprimoradas. “O projeto é fruto de um trabalho acadêmico feito por cinco alunos, que precisava atender uma demanda concreta da sociedade e o trânsito foi uma das principais questões apresentadas”, conta ele, que já é formado em Ciências da Computação e atualmente cursa doutorado na área. Ele e outros dois ex-alunos coordenam uma pequena empresa de base tecnológica e decidiram investir na tecnologia elaborada pelos estudantes. 
     “Algumas empresas disponibilizam o itinerário da frota, mas em forma de lista com os nomes das ruas e não atualizam constantemente, um problema para uma cidade que sofre várias alterações no trânsito por causa de obras como o BRT”, afirma. Baseados nas informações fornecidas pelas empresas e, principalmente, pelos usuários do transporte coletivo, chegou-se ao formato atual do Rota Urbana. Ao acessar o site o internauta se depara com um mapa e dois sinalizadores que podem ser arrastados para indicar os pontos desejados de saída e chegada. Após clicar em “Consultar Linhas de Ônibus” o sistema mostra as opções em um raio de 200, 300 ou 500 metros, que foi a distância máxima apontada pelos entrevistados para se deslocar até um ponto de ônibus.
     Também é possível consultar uma linha específica pelo nome ou número e visualizar todo o trajeto que ela faz. “Eles fizeram pesquisa com usuários de ônibus para saber quais eram as maiores dúvidas e reclamações. A falta de um espaço que concentrasse informações foi uma das queixas”, completa. O projeto foi lançado oficialmente em maio e já registra 150 acessos diários. Adailton atribui a repercussão à ideia que atinge uma carência e à plataforma de fácil acesso. “A pessoa pode consultar antes de sair para pegar o ônibus ou mesmo pelo telefone celular que tenha internet, mas o próximo passo é desenvolver um aplicativo para smartphones que facilite a consulta”, adianta.
     O planejamento do projeto inclui uma série de ações, como a apresentação de outros tipos de rotas. Passeios de bicicleta, patins e roteiros turísticos poderão ser incrementados futuramente. “Dentro de duas semanas, no máximo, os usuários poderão ver a localização das paradas de ônibus, para saberem exatamente onde subir e descer do coletivo”, garante. Por enquanto, o projeto não gera renda, mas Adailton mencionou a ideia de negociar funcionalidades como anúncios de cooperativas de táxis como um meio de garantir as despesas, mas sem influenciar no resultado final gratuito para o usuário.
     A universitária Thalita Oliveira, 21, vê muitas vantagens no Rota Urbana por ser alguém que precisa usar transporte coletivo diariamente e tem bastante dificuldade em memorizar os percursos. “Achei a iniciativa maravilhosa porque quanto tenho dúvidas sobre o caminho que o ônibus vai fazer preciso ligar para conhecidos ou perguntar para as pessoas”, confessa. O aplicativo para celular seria uma solução ainda mais prática para quem já está na rua e precisa tirar uma dúvida, acrescenta ela. “Já tive conhecimento de um site com a descrição das rotas, mas foi atualizado pela última vez há quatro anos e ter essas informações recentes, concentradas em um só lugar ajuda muito”, frisa. 
Adailton ressalta que o projeto não é novidade para muitas cidades brasileiras, como Porto Alegre (RS) e Rio de Janeiro (RJ). “Aqui em Belém as deficiências no trânsito são muitas e podemos adaptar para a nossa realidade, ampliando o alcance para outras cidades do estado, para públicos diferentes e para portadores de necessidades especiais”, comenta. A acessibilidade também é pensada no projeto e, segundo ele, há estudos sendo feitos para que um deficiente visual possa usar o aplicativo e ouvir quais ônibus passam no local em que ele está, assim como o itinerário deles. O site possui versão em inglês e uma página destinada ao “feedback” dos usuários, onde podem ser publicadas sugestões e opiniões. 

TÁXI

     A tecnologia também é aliada dos taxistas e passageiros de Belém que, a partir desse mês, passaram a contar com um aplicativo para celular e internet que facilita a utilização do serviço. O Easy Taxi é uma plataforma que estabelece contato direto entre o profissional e o cliente para minimizar o tempo de espera, pois identifica o veículo mais próximo do usuário em um raio de dois quilômetros. A empresa, lançada no ano passado, atende um milhão e meio de pessoas em 22 cidades, com mais de 40 mil táxis cadastrados em 11 países. A expansão deve continuar até a copa de 2014, com o objetivo de alcançar as cidades que sediarão os jogos. 
     O gerente nacional de operações da Easy Taxi, Fernando Pinheiro, explica o funcionamento do programa. “Uma vez feita a solicitação o passageiro recebe o nome e modelo do carro, além de poder rastrear a localização para evitar desencontros. Ele e o taxista tem acesso ao número do telefone um do outro, facilitando o contato”, detalha. Para ele, o diferencial é a ausência de intermediários e a rapidez no atendimento, com tempo médio de dez minutos para conseguir um táxi, bem menor do que o esperado nas cooperativas de táxi. Em Belém, uma seleção criteriosa será feita para cadastrar os taxistas. “Temos uma equipe de promotores que está visitando os pontos e apresentando o programa, além da divulgação via rádio e um ponto fixo, onde eles devem levar toda a documentação da habilitação e do veículo para ser aprovado”, informa. 
     Além dos documentos em dia, o taxista precisa ter um celular com sistema operacional Android. Para os passageiros, o Iphone também pode ser usado. As informações para o download do programa estão disponíveis no site oficial (www.easytaxi.com.br), que pode ser usado normalmente por quem não possui smartphone. Não há custos adicionais para quem pedir táxis por meio do aplicativo, porém o taxista terá que pagar uma taxa de R$ 2 a cada corrida conseguida por meio do serviço. 
A universitária Thalita Oliveira também costuma andar de táxi para se locomover rapidamente da faculdade para o estágio, mas reclama da demora. “Muitas vezes demora mais tempo para o carro chegar do que o trajeto em si, mesmo que eu entre em contato com a cooperativa mais próxima da minha casa”, queixa-se. Usar a tecnologia para driblar os problemas do tráfego cada vez mais complicado em Belém é uma boa saída, acredita ela, que espera que os investimentos na área aumentem e melhorem a configuração do trânsito na cidade. 

quarta-feira, 1 de outubro de 2014

Ações levam cidadania a Mosqueiro

*Publicado na página Responsabilidade Social, no jornal O LIBERAL de 04/07/2013

BRENDA PANTOJA
Da Redação


    A colaboração e a cidadania são a base para as atividades promovidas pela Organização Não Governamental (ONG) Viva Mosqueiro. Voluntários da entidade e moradores da Ilha se articulam para promover cursos educativos e de capacitação profissional, tornando o espaço referência no distrito em projetos que valorizam a comunidade e investem no potencial turístico da região. O caminho encontrado desde a fundação, há sete anos, foi trabalhar para fortalecer os aspectos sociais e culturais da população, com benefícios que também chegam por meio das parcerias com várias associações, órgãos do governo estadual e instituições.
         Em média, 1.500 pessoas são atendidas mensalmente pela ONG, que conta com um corpo de 120 voluntários permanentes. "A gente busca descentralizar as ações para alcançar o maior número de pessoas possível, já que Mosqueiro é muito grande", explica Daniel Teixeira, um dos coordenadores. A maioria das palestras e oficinas acontecem na sede, que abriga um centro profissionalizante, localizada no bairro da Vila, mas eles também trabalham com espaços cedidos em outros bairros e a cooperação entre os habitantes ajuda a ampliar a difusão de conhecimento. Além de inserir jovens no mercado de trabalho, os cursos aquecem o comércio na época do veraneio. 
         Uma das modalidades muito procuradas é a classe de Alimentação, promovida pela ONG e pelo programa ProJovem, do governo federal. Após as aulas teóricas e práticas, ministradas em seis meses, o aluno sai apto a trabalhar em restaurantes, lanchonetes e quiosques, um segmento bastante produtivo na Ilha principalmente no período das férias escolares. "Conseguir certificação na área é uma garantia de emprego, pois a qualificação faz toda a diferença aqui em Mosqueiro, já que no resto do ano o mercado é bem restrito", afirma a estudante Roseane Pinheiro, 19, que já participou de um curso de informática básica na Viva Mosqueiro. "O trabalho deles é uma ajuda para muitos jovens da Ilha, que encontram na ONG uma base para a formação profissional", avalia.
       Os jovens que procuram a entidade tem outras opções de capacitação, como cozinheiro, faxineiro, porteiro e caseiro, mas podem escolher ainda entre os cursos do ProJovem para  açougueiro ou construção e reparos. A professora Roseane Tabosa atua como voluntária e contabiliza pelo menos 100 alunos nas turmas de serviços domésticos. "São pessoas entre 18 e 29 anos, sempre muito focadas porque sentem a necessidade da profissionalização e entendem que não podem deixar essa chance passar", observa. A rotina de aulas chegou a ser alterada em função do crescimento do movimento na Ilha aos finais de semana, para que eles pudessem trabalhar sem perder o conteúdo das aulas. Para ela, é gratificante vê-los aplicando os conhecimentos e ocupando postos de trabalho graças a uma ação social, além de poder contribuir para mudar uma realidade. As vagas são sempre muito disputadas, pois o programa fornece uma bolsa mensal de R$ 100 para ajuda de custo com transporte e alimentação.
         "Em compensação monitoramos a frequência e a participação deles, que não podem faltar mais de três vezes e precisam participar das atividades relacionadas à formação para garantir um bom aproveitamento dos cursos. A procura é tão grande que se formam listas de espera de um semestre para o outro", conta Daniel. No ano passado, 1.200 alunos concluíram os cursos ofertados em 35 turmas na sede e nos bairros. Uma vez inscrito em alguma classe formada pela ONG, o participante é convidado a contribuir com dois quilos de alimento ou material de limpeza. Essas doações e a arrecadação feita entre os voluntários, que doam cerca de R$ 20 por mês, é a fonte de recursos da ONG. "É daí que sai também a ajuda de custo para alguns professores que moram longe e a verba para a manutenção do prédio", reforça Rosane Gama, que também integra a coordenação da Viva Mosqueiro.
          Ela atribui a solidariedade dos voluntários e moradores ao sentimento coletivo de necessidade presente na Ilha. “Há uma cultura colaborativa em Mosqueiro, porque aqui a vida não é fácil e temos muitas carências que dependem da administração de Belém para serem supridas”, lamenta. É por ver de perto as situações precárias que a população enfrenta em transporte, saúde e saneamento que a ONG utiliza as ações sociais para alicerçar uma proposta maior. “O nosso projeto, a longo prazo,  é criar as condições para a transformação do distrito de Mosqueiro em um município”, justifica Rosane. A própria sociedade já reconhece a ONG como um espaço de utilidade pública, garante a secretária da entidade, Luana Monteiro. “Temos o apoio de contadores, advogados, pedagogos, psicólogos e outros profissionais que orientam e atendem gratuitamente os moradores, mas a burocracia ainda é nosso principal obstáculo”, pontua.
          A cada evento cultural realizado a ONG arrecada mantimentos para a distribuição de cestas básicas. Em 2012 mais de 1.500 famílias receberam os alimentos, mas ainda não é o suficiente para a quantidade de pessoas que pedem auxílio, segundo ela. A instituição também é conhecida em Mosqueiro pelas programações tradicionais, como o Samba Ilha, no carnaval e o Forró Ilha, na quadra junina, que já mobilizaram mais de 70 grupos folclóricos e carnavalescos neste ano. “A ideia é valorizar e preservar a nossa cultura popular, fortalecendo a identidade dos habitantes”, explica Daniel. A Copa de Futsal reuniu 60 times na edição 2013 e foi ponto de coleta das cestas básicas e brinquedos que serão entregues no fim do ano, no projeto Natal Solidário, que pretende alcançar 3.000 pessoas.
         Estimular a consciência social também faz parte da pauta da ONG e a cada dois meses eles convocam uma assembleia de moradores para discutir os problemas da região. As soluções são apresentadas e debatidas também em outras ocasiões, como o Fórum do Idoso, o Encontro de Mulheres “Rosa Shock” e na rádio comunitária “Viva Mosqueiro”. Arnold Monteiro tem 24 anos e é produtor, músico, radialista e está concluindo o curso profissionalizante em Alimentação pela ONG. As várias habilidades o ajudam na hora de conseguir um emprego e ele decidiu usá-las para colaborar com a rádio comunitária, onde trabalha há um ano e meio. “É muito boa a iniciativa de ter um canal direto com a população, onde são divulgadas informações de interesse público, denúncias e serviços”, elogia.
         Para ele, atuar na área de comunicação através da Viva Mosqueiro trouxe grandes aprendizados. “Esse trabalho me ajudou a lidar melhor com o público, saber atuar em equipe e pensar no crescimento coletivo”, completa. Uma pessoa que participasse de todos os cursos fornecidos pela ONG, independente da área de interesse, reuniria conhecimentos sobre corte e costura, artesanato, musicalização, tapeçaria, crochê, informática, bordado, biscuit, customização, entre outros temas, além dos serviços domésticos e profissionalizantes.

LIVRO SOLIDÁRIO

         Dentre as parcerias da ONG está a Imprensa Oficial do Estado (IOE), que apoiou a implantação de um Espaço de Leitura em Mosqueiro, em dezembro do ano passado.  A ação fez parte do projeto Livro Solidário e Daniel estima que cerca de duas mil pessoas foram beneficiadas com a chegada da biblioteca. Cerca de 1.400 publicações foram doadas entre enciclopédias, dicionários, obras literárias e livros didáticos do ensino fundamental ao ensino médio. Daniel Teixeira calcula que, com a implantação do Espaço, cerca de 2 mil pessoas são beneficiadas direta e indiretamente. “São crianças, adolescentes, adultos e idosos que consultam os livros para complementar pesquisas escolares, para enriquecimento cultural ou para apoio didático até mesmo nos cursos que promovemos”, diz ele.
       Esses são os objetivos centrais do projeto, frisa a coordenadora do Livro Solidário, Carmem Palheta. “Através disso se fortalece a inclusão social, o acesso à informação e o exercício da cidadania”, reforça. Desde o começo do trabalho, 25 mil livros já foram arrecadados. Eles chegam por meio de doações da sociedade em geral e passam por processos de higienização, seleção e catalogação. Desse montante, 12 mil já foram encaminhados para os acervos de instituições, hospitais públicos e bibliotecas comunitárias. Ela calcula que aproximadamente 15 mil pessoas foram alcançadas pelo projeto nesse curto espaço de funcionamento.
      “O retorno positivo é o principal indício do êxito que o projeto tem alcançado”, acredita Carmem. Ela destaca o caso da Escola de Ensino Fundamental em Regime de Convênio Associação Cristã do Benguí, que atende 500 crianças e adolescentes entre 6 e 15 anos. A unidade recebeu um Espaço de Leitura e influenciou o planejamento pedagógico da escola, uma vez que o interesse dos alunos pela leitura e produção cultural cresceu visivelmente. Na Feira Pan-Amazônica do Livro deste ano, um grupo de 40 crianças da escola apresentou o espetáculo teatral “A Herdeira das Bruxas: Reciclar para Transformar”, com temática ambiental. A próxima atividade promovida pelo IOE será a Ação Leitura, na Praça do Carmo, na próxima sexta-feira pela manhã, como parte da Festividade de Nossa Senhora do Carmo.

segunda-feira, 11 de agosto de 2014

Unidades de Mosqueiro estão no limite

*Publicado no jornal O LIBERAL de 29/06/2013

BRENDA PANTOJA
Da Redação

   Moradores de Mosqueiro reclamam da dificuldade de encontrar um posto municipal de saúde que ofereça atendimento médico de urgência ou consulta, curativos e medicamentos. A maior queixa é que quando há um desses serviços o outro não está disponível, o que leva os pacientes a peregrinarem em várias unidades da Ilha para conseguir um tratamento mais completo. O Sindicato dos Trabalhadores da Saúde (Sindsaúde) agendou uma reunião na Agência Distrital de Mosqueiro para segunda-feira. No sábado, dia 6, a categoria, com o apoio da comunidade, pretende fechar a ponte de acesso ao distrito e paralisar as atividades nas Unidades Municipais de Saúde caso a Secretaria Municipal de Saúde (Sesma) não responda às reivindicações.
   A cozinheira Vanda Costa, 36, trabalha ao lado da UMS de Carananduba e preocupa-se com o marido hipertenso, que está sem medicação há cinco dias. “Ele já foi em dois postos e não foi atendido, não recebeu o remédio e nem foi encaminhado para se consultar em outro local”, lamenta. A agonia do sapateiro Antônio Rocha de Oliveira, 71, já dura quase quatro anos e nem um diagnóstico preciso ele obteve para as dores que sente no ouvido. “Desde que começou um chiado no ouvido esquerdo eu já fui a três hospitais, incluindo o Bettina Ferro em Belém, mas não consegui fazer nenhum exame e só receitam xaropes que não adiantam nada”, conta. A presidente da associação dos moradores da comunidade Brasil Novo, Fátima Alves, afirma que as equipes médicas são reforçadas somente nos períodos de férias e feriadões por causa dos turistas. “Quando termina tudo e chega agosto, os médicos somem e nós, que vivemos aqui, ficamos na mesma situação”, acrescenta.
   O gerente da UMS de Carananduba, Max Jardim, reconhece que a falta de medicamentos nos postos é um problema geral, mas que os estoques serão renovados nessa terça-feira. “Normalmente funcionamos com um quadro de 18 médicos, que atendem 24 horas, mas com o aumento da demanda em julho receberemos mais quatro profissionais”, garante. Com cerca de 1.500 atendimentos mensais, essa quantidade deve dobrar nas férias. A unidade não oferece aplicação de curativos, pois segundo ele, essa é uma tarefa das Unidades Saúde da Família (USF). No entanto, o gerente disse que deseja implantar o serviço, uma vez que o posto possui estrutura física para tal. Uma das reclamações do Sindsaúde em relação à UMS foi a falta de água causada pela tubulação entupida. Porém, Jardim alegou que o encanamento do prédio funciona normalmente.
   A USF de Sucurijuquara já foi alvo de diversos protestos realizados pelos moradores da região, que neste semestre interditaram duas vezes a Estrada da Baía do Sol para exigir médicos no posto. O último profissional deixou o cargo em 2011 e desde então a população era atendida apenas por técnicos de enfermagem e uma enfermeira. O aposentado Deusdete Dantas, 68, deixou o posto com as guias de uma consulta e um exame marcados para a esposa, que sofre de dor nas articulações e tem problemas renais. “Só consegui consulta para semana que vem e o exame só será feito depois disso no Hospital das Clínicas, mas muitas vezes vim aqui atrás de remédios simples, como pomada para ferimentos e não tinha nada”, relata.
   Os médicos que os moradores pediram durante todo esse tempo chegaram apenas na semana passada. Agora a USF conta com duas profissionais, além dos técnicos em enfermagem para atender uma média de 25 pessoas por dia. A coordenadora da unidade, Ana Santos, admite que o material para curativos não supre a demanda mensal, mas ressalta que os pacientes não deixam de receber o serviço. “Muitas pessoas vem à unidade procurar remédios para hipertensão e diabetes que podem ser retirados gratuitamente também nas farmácias, basta apenas se cadastrar no programa do governo”, lembra. Ainda segundo ela, com a troca da gestão municipal, muitos medicamentos fornecidos estão sendo substituídos e a burocracia do processo licitatório pode atrasar um pouco a entrega. Uma nova remessa de material e remédios está prevista para chegar ao posto no começo da semana que vem.
   As péssimas condições de funcionamento da UMS da Baía do Sol são a principal queixa dos pacientes, que encontram aparelhos de ar-condicionado quebrados, goteiras e até cupim nas instalações. Apesar de o funcionamento ser 24 horas, a estudante Cleiciane Bentes, 19, que está grávida de sete meses não conseguiu ser atendida durante a madrugada. “Estava com muita dor e vim às 4h da manhã, mas as portas estavam fechadas, tive que voltar pra casa e esperar a médica do plantão de meio-dia chegar”, indigna-se. A gerente da unidade, Kátia Pardauil, alega que há 10 plantonistas trabalhando de dia e de noite desde o mês passado, quando a equipe recebeu mais três médicos e ainda aguarda a chegada de um ginegologista e um pediatra.
   “Recebemos um grande número de pessoas de outras comunidades que vem aqui em busca de remédio, vacina ou curativo, o que gera um quantitativo maior do que o esperado e esgota mais rapidamente os materiais e medicamentos”, justifica. Para amenizar os problemas do posto, ela está implantando um sistema que usa a internet para agilizar a marcação de consultas e exames. Quanto aos problemas estruturais, ela explica que o projeto de ampliação e reforma da unidade já foi aprovado e o levantamento do que será necessário foi realizado pela Secretaria Municipal de Urbanismo, mas as obras não tem prazo para começar, porque as licitações ainda serão abertas. A Sesma informou que as unidades de Mosqueiro já estão recebendo todos os materiais para curativos, assim como medicamentos, além de frisar que o atendimento nos postos foi reforçado para as férias de julho.

segunda-feira, 28 de julho de 2014

Cuidado com a boca é nicho de mercado

                                                                                                                *Publicado no jornal O LIBERAL de 05/05/2013

BRENDA PANTOJA
Da Redação

   Parcelar o pagamento do tratamento odontológico é o grande trunfo das clínicas populares, que praticamente dobraram no Estado. Até o final do ano passado, o Conselho Regional de Odontologia do Pará (CRO) tinha 35 estabelecimentos cadastrados e fechou o mês de abril deste ano com um total de 68. Além disso, os preços baixos oferecidos para restauração de dentes, implantação de aparelho ortodôntico e outros procedimentos facilitou o acesso da população de baixa renda ao tratamento dentário, o que incentiva a preocupação com a saúde bucal.
   A presidente da comissão de ética do Conselho, doutora Giane Bestene, reforça que é visível a maior conscientização das pessoas em relação à importância de manter uma higiene bucal. “Esse crescimento também pode ser um reflexo da deficiência na rede pública, então a população vislumbra a oportunidade de conseguir o atendimento com um custo bem menor”, completa. Ela explica que as clínicas populares costumam trabalhar com um grupo de dentistas que atende um grande fluxo de pacientes e recebe comissão sobre a produção diária, que varia entre 30% e 40%.
   Giane calcula que uma restauração simples custe, em média, de R$ 30 a R$ 60, mas frisa que nenhuma clínica é obrigada a seguir uma tabela de preços, apesar do CRO possuir uma planilha de Valores de Referência Regional para Procedimentos Odontológicos (VRRPO). Porém, é primordial que se observe as condições de biossegurança do local, que incluem a esterilização dos materiais e as condições do ambiente de atendimento. “É preciso ficar atento também à qualidade do tratamento, pois os baixos preços podem influenciar nos serviços”, alerta.
   Apesar de ser um atrativo, a propaganda dos serviços odontológicos por um custo acessível não é recomendada pelo Conselho. O novo código de ética da profissão, que entrou em vigor em janeiro deste ano, estabelece que o uso das palavras popular, do povo, pop, para todos, e similares constituem infração ética, por ser considerado “aviltamento à profissão”. Giane acrescenta que também é irregular a divulgação, seja em panfleto ou outro meio, de expressões como "preços baixos", "avaliação grátis", "preços populares", "preços que você pode pagar", ou até mesmo a distribuição da tabela dos procedimentos com seus respectivos valores. 
   As clínicas registradas no CRO já foram notificadas, mas o trabalho de fiscalização só será intensificado a partir de outubro, para que os proprietários tenham tempo de se adequar à medida, informa ela. “Essa regra vem para deixar claro que a Odontologia é uma ciência, um serviço de saúde, e não meramente um comércio”, enfatiza. As reclamações em relação às condições de funcionamento e aos serviços prestados partem tanto dos pacientes quanto dos profissionais e não se concentram somente nas clínicas populares.
   A equipe responsável por fiscalizar as denúncias recebidas no Conselho reúne integrantes das comissões de ética e jurídica, além de agentes da Vigilância Sanitária. O CRO não possui autoridade para interditar uma clínica, mas isso pode mudar caso o projeto de lei 5845/2001 seja aprovado. “Com essa lei nós poderíamos fechar os estabelecimentos por infrações éticas, que incluem atividade em ambiente insalubre”, complementa Giane.  As punições vão desde uma advertência confidencial até a cassação do exercício profissional.
   A clínica Popdents possui quatro unidades de atendimento em Belém e reúne 22 dentistas só no posto localizado em frente ao Ver-o-Peso. O panfleto da empresa, que diz “Dentistas para todos”, informa os serviços realizados após a avaliação gratuita: próteses, extrações, tratamento de canal e outros. A gerente da unidade, Patrícia Zamorim, afirma que a clínica ainda não foi notificada sobre a proibição no uso dos termos estabelecida pelo Conselho Federal. “As alterações necessárias serão feitas, mas não deverá afetar a procura dos clientes”, acredita. Segundo ela, os procedimentos mais procurados são as restaurações e os aparelhos ortodônticos.
   Para a costureira Lerdinalva Mendes, 64 anos, o barato saiu caro. Na busca pelo tratamento odontológico dividido em parcelas acessíveis, ela teve um prejuízo de quase R$ 20 mil. A empresa inicialmente contratada por ela, em 2009, foi a Imbra Tratamentos Odontológicos, que faliu no ano seguinte e deixou incompleto  o tratamento dela e de outras centenas de clientes. “Os procedimentos eram complexos e foram orçados em R$ 12 mil, que pagaria em parcelas, mas cheguei a quitar 60% do valor sem ter recebido os serviços”, conta.
   Quando notou a péssima qualidade dos implantes, ela tentou cancelar o contrato, mas teve as consultas adiadas até que foi comunicada do encerramento da empresa ao chegar à clínica para atendimento. “Depois disso tive que recorrer a outros profissionais para consertar os erros causados pelo tratamento inadequado e desembolsar mais R$ 10 mil”, relata. Ainda assim, a costureira não conseguiu concluir o tratamento, que precisou ser interrompido por falta de dinheiro, já que ela não conseguiu reembolsar a quantia.
   Agora, ela pensa em procurar uma clínica popular, mas tem receio de que o problema se repita. “Faltam procedimentos simples, que são oferecidos a baixo custo em várias clínicas, mas fico apreensiva pela qualidade”, reforça ela, que espera uma fiscalização maior dos órgãos responsáveis. O Conselho tem, em todo o Estado, 409 clínicas cadastradas, sendo 233 na capital paraense. Dos 4.069 cirurgiões dentistas registrados, 2.399 atuam em Belém. Qualquer irregularidade observada pode ser comunicada ao órgão por meio do telefone 3205 1600, das 8h às 17h, de segunda a sexta.

INFOGRÁFICO
O que observar em uma clínica odontológica para evitar complicações no tratamento
- Estrutura do ambiente: Infiltrações e mofo nas paredes propiciam a proliferação de fungos e bactérias
- Condições dos instrumentos: Materiais sujos ou enferrujados podem transmitir doenças.
- Esterilização das ferramentas: Para eliminar uma possível contaminação, é necessário esterilizar em uma estufa, o uso somente de álcool não é o suficiente.
- Licença para funcionamento: O estabelecimento precisa expor em local visível os registros junto ao Conselho, assim como a autorização da Vigilância Sanitária.
- Uso de luvas, máscaras, jaleco e gorros: São materiais básicos dos profissionais, que precisam ser utilizados durante o atendimento para assegurar a proteção á saúde do dentista e do paciente.
- Qualidade do atendimento: Próteses e restaurações que duram pouco tempo, ficam desajustadas ou caem são sinais de material e/ou aplicação precários. O paciente pode e deve procurar o profissional e, caso não seja assistido, o Conselho.
FONTE: DOUTORA GIANE BESTENE, CONSELHO REGIONAL DE ODONTOLOGIA DO PARÁ.

domingo, 13 de abril de 2014

Ver-o-Peso ao amanhecer

*Publicado no jornal O LIBERAL de 28/03/2014. 




      
   Para chegar à Feira do Açaí na madrugada de quinta, o barqueiro Edilson Ferreira, 43, saiu na noite de segunda-feira do município de Afuá, na Ilha do Marajó. As quase mil latas de açaí que ele transportava tinham o Ver-o-Peso como destino certo, em uma rotina que já dura 20 anos. Ele faz o roteiro uma vez por semana e só poucas horas depois do sol nascer, quando já terminou de negociar a venda, é que se recolhe dentro do barco para descansar. Nas primeiras horas do dia, o burburinho e a agitação também tomam conta da Pedra do Peixe, onde chegam os pescados que vão abastecer as feiras livres e supermercados de Belém.
   “Os anos vão passando e a feira só ganha mais força, com mais barqueiros fazendo o transporte do açaí, mais fábricas procurando comprar. Comecei fretando o barco, mas acabei decidindo entrar no negócio e agora são seis tripulantes comigo”, conta. O aniversário de 387 anos do Ver-o-Peso foi comemorado em 27 de março, mas muitos trabalhadores reclamaram do movimento mais fraco do que o esperado para aquele dia. Quando o resto da cidade ainda dorme, às 2h da manhã, é que a circulação começa a aumentar no Ver-o-Peso. O fluxo de carregadores, com paneiros de açaí ou caixotes de peixe acima da cabeça, vai se intensificando gradualmente até atingir o pico por volta das 5h, quando quase não há espaço para transitar em meio às mercadorias.
   O lema da feirante Maria Ferreira, 64, é “quem chega primeiro, negocia melhor”. Ela trabalha na feira do bairro de Canudos há duas décadas e diariamente vai ao Ver-o-Peso para escolher somente as “frutas de primeira”. “Chego às duas ou três da manhã e rapidamente vou escolhendo tudo que preciso, desde a farinha de tapioca até muruci, cupuaçu e tudo que é fruta, todas fresquinhas”, garante ela, que carrega as compras em uma Kombi e segue direto para o ponto de trabalho. Já o vendedor Dilson das Chagas não tem pressa de ir embora. Aos 62 anos, passou os últimos 40 trabalhando na Feira do Açaí, onde diz que chegou “por acaso”. Ele explica a história, mas não para de negociar durante a entrevista, atento para não perder nenhum bom negócio e apelando para a amizade desenvolvida com os compradores (“Você é parceiro e já tá amanhecendo, pra ti eu posso fazer mais barato esse paneiro, pra acabar logo”).
   Depois de ser cobrador de ônibus durante 12 anos, um amigo ofereceu trabalho como carregador. “Como ele trabalhava com exportação, de vez em quando me deixava vender alguns paneiros. Comecei com 10 e hoje vendo uma média de 130 por dia”, lembra. Dilson passa mais tempo na feira do que em casa, chegando ao local normalmente às 16h. “Fico aqui, brincando, conversando, tiro uns cochilos e só volto para casa às oito horas do dia seguinte”, confessa. Para os próximos anos do espaço que considera a extensão de casa, ele tem um desejo. “Espero que nos deixem permanecer aqui, trabalhando, ganhando nossa vida. Fazemos parte daqui, o Ver-o-Peso é o ponto de encontro dos paraenses, um patrimônio histórico e cultural”, destaca.

PEIXES, MINGAU E FRUTAS

   Circulando por entre os balanceiros, Raimunda Silva, 49, escolhe os melhores peixes para levar para a Feira do Entroncamento, onde trabalha há 15 anos. Dourada, tilápia e pratiqueira são as preferências dela, que acorda às 3h para sair de Marituba em direção ao Ver-o-Peso. Passando das 4h30, ela ainda não tinha concluído as compras, mas não tinha pressa e analisava bem a relação de custo e benefício. “Levo sempre entre 170 e 200 kg, mas os preços estão subindo muito. Tive que deixar de comprar pescada amarela e filhote por enquanto”, lamenta. Um dos que negociavam com ela era Ribamar Oliveira, 41, vice-presidente da Associação dos Balanceiros do Ver-o-Peso (Asbalan). Ele estima que circulem 25 toneladas de pescado diariamente na Pedra do Peixe.
   O balanceiro acorda meia-noite para trabalhar de 1h às 8h. “A rotina daqui mudou, antes a venda iniciava às 4h30, mas os compradores foram chegando cada vez mais cedo para negociar”, observa. Os trabalhadores da feira são o principal público de Maria do Socorro Negrão, 49, que vende mingau há mais de 20 anos, ocupação que aprendeu com o pai. Ela dedica quase 14 horas por dia ao trabalho, uma vez que meia-noite começa a preparar o alimento em casa, no bairro do Benguí, e segue para o mercado e só encerra a venda por volta das 14h.
   “Abro a barraca às 3h30 e tem movimento a manhã toda. Aqui me sinto em casa, até me sinto segura. A gente faz amizades e conhece muitas pessoas novas. Também é daqui que pago meu aluguel e sustento meus dois filhos, então me esforço para fazer bem o meu trabalho. Enquanto puder vender o meu mingau, está ótimo”, ressalta, entre risos. Um dos clientes fiéis é o autônomo Haroldo Rodrigues, 60, que não começa o trabalho antes de tomar mingau no box dela. “Frequento o Ver-o-Peso constantemente há 12 anos. Desço do ônibus às seis horas e primeiramente paro aqui para tomar o meu café da manhã, depois sigo para comprar as mercadorias necessárias”, afirma.
   O dia já está claro, são 6h30, e a feirante Rita de Cássia Pereira, 39, trabalha agilmente para organizar as frutas na barraca, em ritmo acelerado. A rotina dela é puxada, principalmente nos três dias da semana em que acorda às 2h da manhã, deixa a casa em ordem, no distrito de Icoaraci, e segue para a Central de Abastecimento do Pará (Ceasa). “No mais tardar, às 4h30, venho de lá para o Ver-o-Peso, com 30 caixas de banana e 10 de goiaba, além de muruci, maracujá e outras frutas”, relata. Os primeiros clientes chegam às 5h e, segundo ela, geralmente são aqueles que trabalham em lanchonetes e vendem sucos e vitaminas, levando frutas em grande quantidade. Somente às 18h30, Rita volta para casa, com os filhos e netos. “Desde os nove anos trabalho em feiras, já vendi nas feiras do Barreiro e do Telégrafo, mas o Ver-o-Peso não tem nem comparação. Se deixar a gente fica direto, o movimento não para nunca. Não troco este lugar por nenhuma outra feira”, admite, com um sorriso animado, pronta para começar mais um dia de trabalho em uma das maiores feiras livres da América Latina.